Caro psiquiatra,

sábado, 28 de julho de 2012


São três e meia da madrugada e acho que sofro de insônia. Tive um dia corrido, fiz coisas e meu humor alterou dentro dos limites. Limites! Sempre estive com eles e sabe, às vezes, me questiono sobre quem eu sou... Quem sou eu, doutor? Será que sou meus comprimidos de tarja preta ou eu mesma? E “eu mesma”, quem é?
Aprendi desde cedo a resolver meus problemas com receitas que consegui em consultórios. Meus pais me levavam, pagavam caro, e eu estava então feliz, (era tudo que eu precisava, conforme me diziam as vozes). A droga que a sociedade aceitou.
Ao longo do tempo sofri repressões advindas destes comprimidos. Quando eu quis extravasar, deram-me balas que me fizeram dormir. Quando quis dormir, era preciso acordar. E agora só me resta um questionamento: Quem eu sou?
Direciono-te esta carta e confesso que não tenho outro alguém a quem direcionar. Me incomoda não saber quem sou. Sinto que nunca fui verdade, as fórmulas nunca me deixaram! Nunca permitiram que eu fosse quem eu quisesse.
Doutor, a sociedade não te aceita como você é, acabei de aprender isso. Tudo ficou mais claro agora, quando troquei os comprimidos por umas doses de conhaque. Sim, não tomei nenhum remédio hoje à noite. Não quero outro tratamento, nunca entendi de fato o que diabos eu tinha, afinal. E também não quero mais saber. Acho que desisto, doutor.
Não tenho orgulho de mim. Manipulada por fórmulas, nunca soube decerto quem eu era. E não há remédio que possa me dizer. Não quero alguém dizendo quando posso sorrir ou chorar. Não quero que me digam quais são meus limites, doutor. Quero testá-los.
Para finalizar, vale acrescentar que me sinto aliviada como nunca senti antes. De certa forma consegui dizer o que há muito guardei. Quero descobrir a resposta para o meu questionamento e deixar de somente existir. Agora já são quase quatro horas da madrugada e aumentarei a intensidade do meu som. Estou intensa, quero expressar isso. Vou beber os drinks que eu quiser, dançarei e cantarei. Pularei! Irei tocar o céu hoje, doutor.
Se vizinhos se incomodarem, provavelmente dirão que alguém do 303 está em surto. Suponho que virão me buscar com camisa de força, mas duvido que me encontrem aqui. Pois retoquei a minha maquiagem, me aprontei. Vou voar, doutor. Liberdade, finalmente.

Você e o seu consultório nunca mais me verão.
Adeus!

Geovana.

Heróis também choram.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

“Pai... ah, meu pai! Eu cresci tanto, né pai? Lembra de quando eu era criança? Você me colocava sobre seus ombros e corria, como se eu estivesse a ponto de voar. Lembra de quando eu tinha seis anos? Você me ensinou a andar de bicicleta, eu dizia pra você me segurar e você me dizia pra seguir sem medo... e eu aprendi a correr sozinha. Caí algumas vezes e ainda caio, mas eu sempre levanto. De joelhos ralados, com dor, assustada com a forma bruta da queda, mas levanto.
Você fazia do meu sorriso o motivo do seu sorriso, pai, e eu sempre achei isso tão bonito! Te admirei tanto que comecei a te ver como o herói que nunca erra. Aí veio aquela senhora chamada "Vida" e me mostrou que nem sempre eu poderia te chamar. Me mostrou que, por mais largos que seus ombros fossem, eles não me aguentariam para sempre. Então tive que caminhar com o coração nas mãos e ter como conforto o silêncio de um espírito que chora.
Tive que criar "Costume" com as coisas e com as situações. Eu não gosto dessa palavra, pai! Não gosto de ter que me acostumar. Não gosto do peso que o mundo joga sobre minhas costas.
Talvez eu tenha mais de você do que imaginávamos, talvez sejamos teimosos, insistentes e trabalhosos, mas hoje tudo o que queria era um abraço seu. Eu sou assim mesmo, sou como um passarinho que precisa voar livre. Mas eu sempre volto, eu prometo, paizinho. Eu prometo.”

Carta de uma confusão

quinta-feira, 5 de julho de 2012


    Hoje o sorriso das pessoas está me ferindo de alguma forma que eu diria desconhecer. Sinto algo em meu peito que não sei descrever. Minha vida está equilibrada. Equilibrada porque se alguém a analisa, diz que tenho tudo que preciso. Eu mesma não sinto que algo falte. 
    Me desapeguei de algo que deveria desapegar, me refiz, me completei e abri meu coração à vida. Vida tal que hoje estou incapaz de sentir.
    Angústia, tão amarga... Estes sorrisos ilusivos. Por que me ferem tais, por que me machucam? A vida é efêmera, a vida por si só me fere. Não tenho medo de morrer, mas de viver, na maioria das vezes, sim.
    Futuro, existe algo mais assustador do que tu és? Porque me roubastes tantas coisas e trocastes teu nome para "Presente", trazendo-me coisas novas e que sim, por vezes até agradáveis, diga-se de passagem; mas por alguma razão obscura e melancólica, vivo apegada ao nome que tens e que habita no ontem: Passado.
   Tempo... Tão confuso. Será que ele passa ou nós passamos por ele e somente isto? Mudaram as estações, mas o que é atemporal ficou. Será que sou atemporal? Se sim, para onde é que vou depois daqui? 
    Meu espírito quer ser livre, hoje sinto as prisões do meu corpo, e meu corpo chora as repressões de uma sociedade corrompida por sistemas que há muito falharam e existem apenas para destruir pessoas com espíritos bons.
    Eu e o meu discurso incompreensível de não habitar aqui, de não entender o que se propõe e de viver a ideologia de ser livre. Embora saiba que liberdade é tão utópico quanto os sonhos mais indescritíveis que guardo em mim.

"And i know it's a wonderful world
But i can't feel it right now
Well, i thought thad i was doing well, but i just wanna cry now."
James Morrison, Wonderful World


23.06.2012
Uma tarde angustiante, qualquer e incomum.

À um lado meu que vive em outro corpo.

terça-feira, 3 de julho de 2012

Oi. Não sei como começar isso, rs. Sabe o que é? Tenho muito a dizer, mas não sei se tenho coragem. Olha, é raro me ver reconhecer covardia, isso mostra que estou indo longe. Talvez eu tenha chegado em um ápice de saudade e cansaço tão extremo, que comecei a me perder.

Por falar em saudade, neste exato momento, estou tentando disfarçá-la ouvindo aquela música que aprendi no piano. Lembra? Eu sei que sim. Isso sempre foi coisa minha, até eu descobrir a sua existência. Quando descobri que você existia, todas as minhas manias passaram a ser suas também. Tudo o que eu fazia pra passar o tempo agora tinha uma conotação diferente, pois trazia seu rosto à minha memória. Sem que eu percebesse, você estava presente em qualquer coisa que eu fizesse...

Como isso é possível? Como duas pessoas podem ser completamente iguais e, ao mesmo tempo, conseguirem se completar de uma forma tão perfeita? Como podem ser lados opostos sendo um único ser? E como pode uma pessoa viver em dois corpos?

Uma vez eu li isso: "Você é o brinquedo caro e eu, a criança pobre." Ainda assim, me sinto diferente agora. Consigo te ver como brinquedo caro, mas não me vejo como criança pobre, - não por mérito meu - você nunca permitiu que eu me sentisse menos do que especial. Me vejo então, como a criança que o viu na vitrine, encheu os olhos de brilho, chegou em casa e pediu dinheiro ao pai. Quando voltou à loja, porém,  era tarde. Alguém já tinha levado o brinquedo embora. Não havia previsão de quando chegaria algo parecido. E eu fui pra casa sem saber perder. Sem querer comprar outro brinquedo, querendo aquele, só aquele.

Sempre fomos honestos um com o outro. Ultimamente a vida tem tomado um rumo que nos confundiu. O que fazemos agora? Começo a ficar com medo. Decidi seguir a minha estrada. Gostaria de ter você por perto, poder trocar informações, sei que estou exposta a quedas, mas talvez você não possa me carregar agora. Tudo bem, não lhe cobrarei. Não vou chorar também, você sempre disse que eu era forte. Eu aguento. Está tudo bem. Mas vê se não se perde, tá? Mesmo de longe, seu coração ainda é igual ao meu, e o meu, igual ao seu, e sempre vai ser assim.