Inacabado

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Mais uma manhã entre tantas outras, onde eu sequer lembrava se tinha dormido ou não. A luz do sol entrava pela janela e transpassava as camadas finas de cortina branca estampada, cujos desenhos eram refletidos sobre a mesa da cozinha. Cozinha que lembrava cozinha de sítio, ou casa pequena interiorana. Devia ser cerca de sete horas da manhã. Eu me recordo de encarar o calendário-imã colado na geladeira e tentar lembrar sobre como eu tinha passado os dias anteriores. Doze meses, 366 dias. Ano bissexto. Os domingos eram marcados por tinta vermelha que inevitavelmente associei a sangue, que acreditei não estar mais correndo em minhas veias. Que associei a dor. Que associei a perda. Que associei a mim. Eu tinha me perdido e nada poderia doer mais do que isso. Que seja. Os sábados não tinham marcação especial, como se não houvesse nada de especial neles também. Será que dor tem limite? Porque se tiver, posso dizer que cheguei próximo, se não tiver chegado ao limite. Cheguei a ponto de desligar qualquer percepção sobre o ambiente a minha volta. Desliguei as minhas reações, desliguei a compaixão, desliguei o senso de justiça, desliguei tudo o que podia me trazer uma lágrima, e embora meu rosto estivesse molhado ao observar o calendário e buscar lembranças, eu posso lhe afirmar que não senti nada. Nem sei o porquê do choro. Meu corpo estava tão amortecido que eu poderia apanhar até a morte sem gritar. Acredito que aquela lágrima veio da ultima parte de mim que ainda podia sentir. Daquele lado escondido, como um estepe, em caso de querer retornar à vida. Era a minha ultima parcela de humanidade morrendo, mas antes, lamentando pela própria morte. Pela minha morte. Por um corpo que carregava um espirito sem vida. Era o luto ao perceber que a vida passava por mim, os dias se foram e se desfizeram como fumaça no ar. Passaram sem nada que os justificassem. Como se todo o tempo “vivido” até então, fosse perdido.

Ao Noel

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Querido papai noel, sei que o natal já passou e que não fui um bom menino nesse ano que passou. Sei que fiz muitas coisas erradas e que, provavelmente, eu não mereça um presente. Claro, eu sei, eu sei, sei que fiz coisas boas também e que, teoricamente, a mente humana só deveria guardar as coisas boas... por que será que isso não acontece comigo? Enfim, acho que esse não é seu departamento não é?

Apesar de não ter sido um bom menino, de não ter feito tantas coisas boas quanto eu poderia, gostaria de pedir um presente... se for possivel, claro. Já não tenho idade pra acreditar em papai noel, mas mesmo assim gostaria que o senhor me trouxesse o que vou pedir. Ok ok, estou me prolongando demais e creio que agora que o natal passou o senhor quer mais é tirar umas boas férias né? Gostaria de pedir que todos os meus amigos tivessem o próximo ano como o melhor ano que já tiveram, que conquistem o que desejam, que fiquem a maior parte do tempo possivel felizes. Espero que o senhor consiga me dar esse presente.

Forte abraço.
Eu.

Saudações da Terra

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Olá ser de outro planeta que não é a Terra. Primeiramente deixe eu me identificar: eu me chamo (ou chamava, não sei quantos anos levaram pra achar essa "arca" com algumas coisas típicas da Terra junto da minha carta) Danilo. A Terra é o terceiro planeta próximo à uma estrela amarela no braço de Órion, que é onde existem três estrelas quase juntas, formando um paralelo. Creio que, mesmo que possam ir até esse planeta agora, não me encontrarão. Não duvido nada que não encontrem mais a raça a que eu pertencia. Os homos sappiens.

Eramos um povo, na essência, até pacífico, a grande parte de todas as pessoas que viveram em nosso querido planeta viveram em harmonia umas com as outras. Umas poucas causaram divergencias entre si e arrastaram multidões até suas guerras sem sentido que acabaram consumindo muitos recursos que hoje, no instante que escrevo essas linhas, já são escassos e se aproximam de um fim eminente. Não sei o quê acontecerá com a humanidade (que é a forma como chamamos o grupo de homo sappiens que dominou o planeta) e com as outras espécies que habitam o planeta.

Enfim... dentro deste baú existem alguns livros, que foi a forma mais importante do homem aperfeiçoar durante a vida, diversos destes livros que estão aqui fizeram parte da minha vida, da forma que eu aprendi a ver o mundo. Um livro de história, um de contos de fadas (no proprio livro verão uma explicação pro que são as fadas), um livro de poesia e mais alguns livros diversos... nenhum de minha autoria.

Coloquei, também, fotos de lugares bonitos, de construções, de obras de arte, da fauna, da flora e dos humanos no seu cotidino. Trabalhando, estudando, comendo, dormindo, amando (no meio dos livros há um dicionário, vão encontrar o significado de "amor" lá... não o total significado, esse só vão encontrar dentro de vocês mesmos)... enfim, vivendo!

Dentro, também encontrarão, algumas formas terráqueas de expressar o que sentem: música. Vão achar desde música que chamavamos de clássica até o que chamavamos de pop. Junto coloquei um aparelho que possibilita ouvir tudo isso, afinal não sei quais são suas tecnologias e formas de expressão.

Apesar de não parecer, nossa cultura foi bastante produtiva, os múitos séculos de evolução em nossas tecnologias me permitiram criar essa arca e manda-la até vocês, estejam aonde estejam. Espero que consigam visitar meu planeta e que ele ainda esteja habitado por humanos... se, no primeiro contato, os humanos parecerem arredios não se preocupem. Essa é a forma que nós encontramos de nos defender do que não conhecemos. Mas insistam, procurem demonstrar que o objetivo de vocês é a paz e o contato entre os povos dos dois planetas.

Atenciosamente,
Danilo, um terráqueo.

Astronauta de Mármore 2

domingo, 9 de dezembro de 2012

Mãe, espero que a senhora me perdoe, mas hoje eu pequei. Não sei se tenho mais salvação, todos os dias alguem aparecia com os "bang" pra nós aqui nesse buraco. Porém nos últimos dias pararam de trazer, não sei quem trazia, só sei que era bom, era cômodo, era até, prático. Podia jurar que vinha praticamente por mágica. Téo era quem trazia. Não me importava como, mas ele trazia para todos nós aqui embaixo. Só que ontem ele não conseguiu e me pediu ajuda pra conseguirmos mais, quem sabe até trocar esse buraco malcheiroso por um lugar mais limpo. Ontem, durante o efeito, eu vi algumas ratazanas comendo o pé de um colega de buraco. Não sei se isso foi minha imaginação ou aconteceu mesmo.

Assim que saí meus olhos arderam. Estava algumas semanas longe da luz do sol. Téo me entregou um embrulho e disse que eu só precisava mostrar pra pessoa e pedir o dinheiro que me dariam. Como eu estava praticamente neurótica sem aquilo em mim eu topei sem hesitar. Saí andando apressada, quanto antes eu fizesse o serviço antes eu teria a droga. Abri o embrulho... era uma faca dessas de cozinha toda enferrujada. Fiz o que Téo disse. Roubei a carteira e o celular de uma menina que não deve ter mais de 20 anos. Na hora me senti triunfante, vitóriosa, comprei e troquei tudo por elas. Em meia hora eu estava em um beco. Perfeito. Me senti o máximo sabia? Eu podia fazer tudo, era só balançar aquela faca na frente e pedir que me dariam o dinheiro!

Mas agora... agora que o efeito passou eu passei a me sentir terrivel. Como eu pude? Não sei quem é a pessoa que roubei, não olhei nem o rosto dela, não sei se era loira, morena, baixinha, alta, nem mesmo posso dizer se ela era menina ou idosa. Só sei que era mulher pela voz fina, irritante, dizendo "calma, não me mate...". Mãe, vem me salvar? Me tira daqui por favor. Nem que tenha que me matar, mas não quero mais fazer isso. Lá vem o Téo... é hora.

"O que fizemos de nossas próprias vidas?"

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Ao amigo que entre tantos, eu escolheria para ser meu. Tal como escolhi em algum momento da vida, porque embora algo tenha nos unido sem que houvesse chance de escolha, quando seus olhos repletos de coragem encontraram o meu olhar medroso, pude ter certeza que melhor amigo entre os seres humanos eu jamais encontraria, você seria minha escolha caso eu pudesse fazê-la. Eu escolheria você com todo ar que existe em meus pulmões e até onde a memória me deixa ir, digo que sempre foi assim.
Quantas lembranças suas terei eternamente latejando dentro de meu coração, escrevo para você e sinto um nó na garganta se originar, caso eu dê a ele chance de se desfazer, as lágrimas irão avançar pelo meu rosto tentando encontrar calma. A calma que eu encontro e perco em questão de segundos... Existem coisas que não consigo controlar.
Hoje em dia eu duvido que você me conheça tão bem como conhecera no passado. Fato é que o tempo passa e nós não percebemos isso, acreditamos que as pessoas permanecem as mesmas, ou notamos a mudança, mas deixamos um abismo tão imenso nos distanciar que quando vemos, não somos mais as mesmas perto delas. Eu realmente duvido que eu seja a mesma em uma conversa rápida hoje em dia. Porque somos feitos de conversas rápidas. E de repente os gostos mudaram, as ideias se transformaram, sonhos morreram, sonhos nasceram, remédios foram adicionados à vida, talvez algum vício, alguma mania, medos se foram, medos chegaram... A saudade cresceu. E cresce todo dia, o problema é que a distância também.
Não se culpe por essa herança, existem coisas que todos nós não conseguimos controlar.
Talvez não seja nada disso.

Te odeio

Te odeio quando acordo e vejo que não está na cama. Te odeio quando ouço barulho na cozinha e sei que está fazendo o café, odeio mais ainda ter que disfarçar que estou dormindo pra que me acorde, odeio - não muito - seu beijo com gostinho de pasta closeup. Odeio quando me fala aquele "bom dia" repleto de amor, todo meloso e adocicado. Odeio tudo ao espelho, assim como essa carta escrita na madrugada insone e deixada aqui, na mesa da cozinha, saiba que ela é assim, ao espelho, e avessa ao real motivo do ódio. Agora releia trocando os odeio por adoro/amo e venha repetir o café na cama de todos os dias. Não demora, te amo.

Bar

sábado, 1 de dezembro de 2012

Bem vinda ao clube dos corações vagabundos, de paixões doentias, de almas cheias de sonhos e desejos. Será que alguem nos tirará desse bar?
Desse sofrimento?
Dessa inconstancia?
Dessa dor?
Dessa.. agonia? Não, agonia não...
Apenas mais uma dose e vou parar, juro (juro com os dedos cruzados porque sei que vou quebrar meu juramento e assim não corro o risco de levar alguma punição de algum santo ou deus-apocalptico-que-monitora-juras-falsas-e-pune-quem-não-cumpre).
É... eu já sei
Garçom, outra dose sim?!

Farmacodependencia

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Quem me vê passar provavelmente pensa que se eu deixasse de existir, não faria a menor diferença. Tudo bem, as vezes também penso assim. Já perguntaram se eu tinha problemas com álcool ou usava drogas ilícitas, já fiz terapias e também me levaram a palestras que alertavam sobre os riscos da cocaína e do crack. Mas erraram. Diferente do que os estranhos pensam, não sou o tipo "nóia" que financia o tráfico, sou o "nóia" que contribui com o estado. Hipocondria não é o termo correto, pois não tenho medo de adoecer, eu tenho medo da vida. O nóia que usa as "drogas fornecidas pelo governo". O nóia que paga impostos. O nóia socialmente aceito. Sou o drogado da farmácia. Um drogado lícito. Um doente.

Devo dizer: na prática, é quase igual. Um viciado em cocaína sofre com a fissura e precisa a qualquer custo da droga pra evitar um surto. Eu vivo o mesmo. Não é o "pó", mas são os comprimidos. Sedativos e mais sedativos. Tive a fase da anfetamina, mas essa consigo controlar com mais facilidade. Psicotrópicos, bendiazepínicos... Eu poderia citar qualquer tipo de droga e explicar seus efeitos. Sou um viciado "consciente" - se é que isso existe. Eu sei que tantos remédios pouco a pouco começam a matar, mas não importa muito. No fundo nada importa. O vazio dentro de mim é maior do que a minha força pra lutar contra o vício. Não tenho paz, minha tranquilidade só aparece quando estou sedado. Sou covarde. Sou a vergonha da família, a sujeira escondida debaixo do tapete.

Agora mesmo estou "sóbrio" e olha só: não é uma boa ideia. Cá estou, expondo meus dramas publicamente. Lamentando. Antes que pense qualquer coisa, saiba que não sou um desocupado que precisava ter apanhado mais na infância, nem mesmo meu nome você sabe, então peço gentilmente: não me julgue. Não sei lidar com culpas e se você me acusar de qualquer coisa, terei que tomar mais comprimidos do que o habitual. Aprendi a não precisar de ninguém. Não preciso de amigos, não preciso de amores, não preciso. Só preciso das minhas fórmulas de equilíbrio.
Criei minhas próprias estratégias, minhas próprias fugas, aprendi também a puncionar veias, afinal, nas minhas piores crises eu não suportaria esperar o efeito dos remédios começarem. Demora demais. É bem mais rápido dissolver e injetar. Como você vê, não existe mesmo grande distinção entre a minha vida e a vida do drogadinho jogado em uma cracolândia. É o mesmo vácuo interno, a mesma prisão, o mesmo buraco, separados apenas por classes.

Não sei resistir, então prefiro viver como um zumbi. Amortecido, anestesiado, fora de mim. Prefiro não pensar em mais nada. Prefiro não sentir dor. Prefiro assim, estar 24 horas por dia completamente "drogado", porque sentir dói, e dor se alivia com remédio.


 Atenciosamente,
O "chapado" que está tentando sobreviver a mais um dia de abstinência.

Astronauta de Mármore

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Mais um dia nesse buraco... são nesses momentos de lucidez, em que não estou com aquilo em mim, que me lembro aí de casa e que mais sinto saudades tuas, mãe. Sei que não sou a melhor de suas filhas (na verdade sei que devo ser a pior, aposto), mas, queria ter forças pra sair desse buraco fundo em que me enfiei, queria mesmo. Não é clichê de viciada. Sei que nada do que aconteceu conosco, do que aconteceu em nossa casa justificava o que acabei fazendo e onde vim parar, porém acabei dando aquele passo, aquela fuga na madrugada. Precisava sair. Sei que não vai me entender, que não vai me perdoar (e nem espero o contrario) mas, mesmo assim... eu gostaria do seu perdão um dia.

Os dias aqui não são fáceis, no meu buraco vivemos em mais de vinte, dos quais eu sei o nome de meia dúzia, dos quais eu conheço a história entrecortada de um ou outro. Consegui esse papel e caneta com um desses amigos, Téo, ele disse que achou na rua e trouxe pra cá... mas acho que a história não é bem essa, mas não vem ao caso agora. Já sinto meu corpo tremer, minha letra deve estar quase ilegivel agora, eu estou tentando me controlar mas não consigo mais, há muito perdi o controle sobre isso e, tem momentos que espero morrer logo, pois a cura parece algo distante demais.

Bodas de Prata

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Que dia é hoje? Alguém se lembra? "Quinta-feira", é o que ele diria e eu mais uma vez concordaria dizendo: "É... Quinta-feira." E guardaria o meu silencioso pesar.
Acordei essa manhã e vi que ao meu lado ainda adormecido, estava o homem com quem me casei há exatamente vinte e cinco anos atrás. Quando o conheci eu ainda era bem jovem e cobiçada. Tinha um bom emprego e dava os primeiros passos livre das correntes de minha infância e adolescência tão limitadas. Eu cresci sonhando apenas com liberdade. "Casar" nunca foi prioridade. Aí ele apareceu. Tentei desistir umas três ou quatro vezes, mas ele se atirava em frente ao meu carro, ameaçava suicídio e me tirava do trabalho, até que eu voltasse pra ele. Acreditei que ninguém me amaria como ele amava, então nos casamos em Novembro de 1987. Não posso mentir: quando casei, não o amava, mas tinha esperança de amar um dia. Três anos depois tivemos um casal de filhos gêmeos. Ele trabalhava 14 ou 15 horas por dia, as crianças choravam em tempo integral, foi questão de tempo até que eu estivesse submersa em uma depressão profunda. Ele perdeu o emprego na mesma época em que eu estava a ponto de tirar minha vida.

Chovia quando ele me encontrou prestes a engolir um punhado de chumbinho. Ouvia-se o som dos trovões e o choro dos bebês, como se não bastasse, lembro do rosto dele, empalidecido, me dizendo pra pensar nas crianças.
Ah, as crianças! Perdi as contas de quantas vezes encarei aqueles bercinhos implorando que eles crescessem logo e, que ao menos uma vez, pudessem cuidar de mim. Então me calei, acreditei que o tempo levaria aquela onda de desespero pra longe e finalmente as coisas ficariam mais calmas. Engano meu.

Logo ele voltou a trabalhar, os bebês foram crescendo, a vida seguia implacável. Eu ia a reuniões de escola, lavava roupas, preparava a comida, fazia curativos, dava remédios pra febre, apartava brigas, tudo sozinha. Não tinha mais "família", amigos ou passeios. Eu era mais uma dona de casa. De menina invisível a Cinderela. De Cinderela a robô. Não podia chorar na frente deles, quando as lágrimas apareciam, eu me trancava no banheiro, até que cansada de fugir, acabei deixando minhas emoções de lado. Sobrevivi, todo esse tempo, sobrevivi.

Vinte e cinco anos depois, o espelho me mostrava uma adolescente quase-morta, triste e com rugas. Acorrentada, mais uma vez. Meio sem rosto, meio sem identidade. Mais uma dona de casa, entre tantas outras. Logo eu, que apreciava tanto o ar da juventude! Nem parecia a mesma moça que há pouco mais de 25 anos atrás recebia vários convites pra jantar dos rapazes mais bonitos da cidade. Nem parecia a mesma garota que sonhava em ser bailarina e se apresentar para grandes plateias por todo o mundo. E nem me dou ao luxo de pensar como teria sido, talvez esses devaneios me tragam desgosto e arrependimento.

Mas e quanto àquele homem que acordou ao meu lado? Onde ele estava durante todos esses anos? Onde ele estava quando precisei me sentir humana? Quando as crianças gritavam a dor de um dentinho nascendo ou tinham febre alta, onde ele estava? Onde ele estava quando eu era consumida pela solidão dia após dia? Trabalhando, não é? Tudo bem, eu não posso reclamar. Pode ser que nem mesmo eu tenha o direito de murmurar, já faz tempo demais.
Eu só queria compartilhar a minha linda história de amor nessa data tão especial. Queria desejar um "Feliz 25 anos de casamento" a esse homem que acha que hoje é apenas mais uma quinta-feira e dizer que com o passar dos anos, passei a amá-lo. Não sei bem como é o amor, mas acredito que o amo. As vezes, senti estar dormindo com um estranho que talvez nem saiba lhe responder corretamente se você perguntar a ele a cor dos meus olhos.  E queria por fim, dizer que ainda lembro do ultimo "eu te amo" que ouvi da boca dele em Novembro de '87. Pois esse mesmo "eu te amo" que me fez acordar vinte e cinco anos seguidos ao lado dele, ainda que quase desconhecido.

Feliz Bodas de Prata, querido.

Admirador Secreto II

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

          Olá Carolina, sei que andou comentando minha última carta com suas amigas intimas... não gostei disso, mas tudo bem, te entendo! Sei como é a curiosidade coçando, reclamando, querendo desvendar isso o quanto antes. Porém uma pessoa, em especial, não gostei que ficou sabendo das cartas, aquela sua amiga loira, que vive andando em trajes sumários. Francamente Carolina, ela espalhou o comentário da carta por todo o campus!

          Se, quando terminei a carta anterior, meu objetivo era me revelar nessa... pode esquecer. Não saírei da toca tão cedo. Mas, apesar da decepção, saiba que eu ainda te amo e nenhum tipo de comentário maldoso irá atrapalhar nossa história de amor, Carolina!

          A carta que virá após essa, terá algumas pistas sobre mim, aposto que há de se lembrar de mim depois que lê-la! No entanto não quero mais saber de minhas cartas, na mão daquelas suas amigas falsas, não gosto delas. Acho que poderia ter amizades melhores, não? De qualquer forma, sei que logo vamos deixar tudo isso para trás e seguiremos rumo ao nascer do sol!

Com amor, Seu Admirador Secreto.

Admirador Secreto

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

          Olá, Carolina, sei que não me conhece, mas eu lhe conheço muito bem, sei praticamente tudo a seu respeito, sei que horas acorda, que horas sai, que horas toma café, que horas dorme, que horas vai ao banheiro... mas não se assuste, não sou um psicopata ou algo do gênero! Muito pelo contrario... eu sou o que se poderia chamar de admirador secreto. Passo os dias e as noites pensando em você, tudo bem que eu ainda não tive coragem de me revelar e sair aqui de minha penúmbra quase fúnebre.

          Mas um dia eu ainda vou sair daqui e ir ao seu encontro. Vou lhe convidar para saírmos, no passeio vamos dar as mãos e vamos deixar todos os outros casais mortificados de inveja, tamanha será a nossa felicidade estampada em nossos rostos! Ok, eu exagerei, mas, como sei que faz artes cênicas, e que está trabalhando arduamente em um papel em que irá fazer uma linda jovem que sempre consegue sorrir apesar dos pesares, das interperes, acabei me dando ao luxo de colocar uma pequena interpretação. Porém não tenho seu talento.

          Deve estar se perguntando quem sou eu e porque não jogou essa carta no lixo sem lê-la até aqui não é mesmo? Viu como lhe conheço bem, Carolina, sei que sua curiosidade foi maior do que qualquer outra coisa e que agora deve estar se jogando no sofá tentando identificar o estilo de escrever, mas creio que não me reconhecerá. Espero nas próximas cartas revelar quem eu sou, ou... quem sabe bater na sua porta e lhe convidar para sair.

Com amor, Seu Admirador Secreto.

Prezado politico,

sexta-feira, 28 de setembro de 2012


Depois de muito pensar, muito ponderar, resolvi aceitar sua proposta e vou lhe vender meu voto. Não exijo que, caso eleito, crie novos projetos, novas leis, novos decretos... exijo, apenas, que cumpra um bom mandato, que honre os compromissos que está se propondo no seu panfleto e em suas reuniões ao redor da cidade.

Como não gosto de enrolar, vou direto ao ponto chave desta carta: a venda do meu voto ao senhor. O preço que lhe peço é que pague um bom plano de saúde para minha familia pelos quatro anos de seu mandato, porque sabe né, a saúde pública está de mal a pior. Que minhas filhas tenham vaga assegurada naquela escola particular com boa nota e que aprova muitos alunos em faculdades de grande qualidade, porque se depender da qualidade das escolas públicas, elas malmente vão conseguir vaga para trabalhar de faxineira. Quero, também, um segurança particular, vinte e quatro horas por dia, pois a polícia, atualmente, não anda cumprindo a contento esse quesito. Quero, ainda, um carro, pois depender do transporte público anda complicado... ônibus quebrados, creio que me compreende.

Claro que sabe que, se não puder pagar tudo isso, creio que não lhe venderei meu voto.

Atenciosamente, Eleitor.

Cubo Mágico

domingo, 16 de setembro de 2012

Perdi alguns minutos dessa manhã de sexta-feira encarando no espelho um rosto que me parecia desconhecido. Barba mal feita, cabelo desajeitado, quase o aspecto de um mendigo. Eu estava perdido, outra vez. Era a mesma casa, o mesmo velho banheiro, mas eu não tinha ideia do que estava fazendo ali. Entenda: quando digo "ali", me refiro ao cotidiano que me envolvia. Já eram quase 11hrs de uma manhã nublada, procurei pelas chaves do carro, mas não me encontrei em condições de dirigir. 

Decidi caminhar ao ver a rua, a claridade. Tudo isso era estranho. Claro que via isso tudo, todos os dias. Mas hoje, parecia como se eu tivesse saído da sessão de cinema, aquelas que duram 3 horas e começam no fim de tarde. Se entra com dia claro, se sai com noite escura. E aquela noite parecia sempre mais escura. Mais estranha, mais irreal. Assim como essa claridade.


O primeiro passo. Virar de costas pra rua e trancar a porta. O tênis da caminhada ainda tinha uma prestação pra pagar ou eu já quitei? Não lembro. A rua. As pessoas. Tudo parecia vago e distante. Mais do que o habitual. Mais do que o corriqueiro. Devia ter pego os fones de ouvido... assim não precisaria sorrir falsamente e comprimentar, tão falsamente quanto sorrir, os vizinhos e conhecidos.

 Por que tudo parecia tão fora de conexão? Como se eu já não me encaixasse mais. Lembrei então de quando eu tinha aproximadamente 13 anos, uma tia me deu um "cubo mágico" que passei a levar comigo pra onde quer que eu fosse. Nunca consegui resolvê-lo, e era exatamente assim que me sentia: um cubo mágico. Indecifrável. Qualquer um poderia ter arracando meus blocos e tentado montar de suas próprias formas usando de trapaça. Afinal, eu era só um louco. Um solitário andando por uma vizinhança indiferente, sofrendo debaixo de um céu tão longe...

Uma esquina. O que me impedia de me jogar em frente desse trânsito? Olhei pra cima como se perguntasse a Deus isso. Quantas pessoas chorariam? Talvez só o dono da loja de calçados, chorando a divida do tênis que não terminou de ser paga. Ninguem mais sentiria a falta. Talvez, daqui algumas semanas, um vizinho comentasse com o outro "e que fim levou aquele cara que vagava sem rumo aqui pela rua?" ao que o outro responderia "ouvi dizer que voltou pra Minas, parece que tem parentes por lá...". E assim seria o meu fim. Malmente lembrado. Ameacei dar o fatidico passo. O sinal fechou. Sinal divino? Acreditei que era sinal divino então. Quando dei o último passo já do outro lado da rua vi algo que me lembrou uma velha amiga que tinha perdido o contato. Ela sempre me disse que, se eu não pudesse estar bem, era pra eu sobreviver a mais hoje. Apenas isso. Amanha teria de ser melhor. Suspirei acreditando nisso, mais uma vez.




Escrito por mim e pela Thata.

Caro psiquiatra,

sábado, 28 de julho de 2012


São três e meia da madrugada e acho que sofro de insônia. Tive um dia corrido, fiz coisas e meu humor alterou dentro dos limites. Limites! Sempre estive com eles e sabe, às vezes, me questiono sobre quem eu sou... Quem sou eu, doutor? Será que sou meus comprimidos de tarja preta ou eu mesma? E “eu mesma”, quem é?
Aprendi desde cedo a resolver meus problemas com receitas que consegui em consultórios. Meus pais me levavam, pagavam caro, e eu estava então feliz, (era tudo que eu precisava, conforme me diziam as vozes). A droga que a sociedade aceitou.
Ao longo do tempo sofri repressões advindas destes comprimidos. Quando eu quis extravasar, deram-me balas que me fizeram dormir. Quando quis dormir, era preciso acordar. E agora só me resta um questionamento: Quem eu sou?
Direciono-te esta carta e confesso que não tenho outro alguém a quem direcionar. Me incomoda não saber quem sou. Sinto que nunca fui verdade, as fórmulas nunca me deixaram! Nunca permitiram que eu fosse quem eu quisesse.
Doutor, a sociedade não te aceita como você é, acabei de aprender isso. Tudo ficou mais claro agora, quando troquei os comprimidos por umas doses de conhaque. Sim, não tomei nenhum remédio hoje à noite. Não quero outro tratamento, nunca entendi de fato o que diabos eu tinha, afinal. E também não quero mais saber. Acho que desisto, doutor.
Não tenho orgulho de mim. Manipulada por fórmulas, nunca soube decerto quem eu era. E não há remédio que possa me dizer. Não quero alguém dizendo quando posso sorrir ou chorar. Não quero que me digam quais são meus limites, doutor. Quero testá-los.
Para finalizar, vale acrescentar que me sinto aliviada como nunca senti antes. De certa forma consegui dizer o que há muito guardei. Quero descobrir a resposta para o meu questionamento e deixar de somente existir. Agora já são quase quatro horas da madrugada e aumentarei a intensidade do meu som. Estou intensa, quero expressar isso. Vou beber os drinks que eu quiser, dançarei e cantarei. Pularei! Irei tocar o céu hoje, doutor.
Se vizinhos se incomodarem, provavelmente dirão que alguém do 303 está em surto. Suponho que virão me buscar com camisa de força, mas duvido que me encontrem aqui. Pois retoquei a minha maquiagem, me aprontei. Vou voar, doutor. Liberdade, finalmente.

Você e o seu consultório nunca mais me verão.
Adeus!

Geovana.

Heróis também choram.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

“Pai... ah, meu pai! Eu cresci tanto, né pai? Lembra de quando eu era criança? Você me colocava sobre seus ombros e corria, como se eu estivesse a ponto de voar. Lembra de quando eu tinha seis anos? Você me ensinou a andar de bicicleta, eu dizia pra você me segurar e você me dizia pra seguir sem medo... e eu aprendi a correr sozinha. Caí algumas vezes e ainda caio, mas eu sempre levanto. De joelhos ralados, com dor, assustada com a forma bruta da queda, mas levanto.
Você fazia do meu sorriso o motivo do seu sorriso, pai, e eu sempre achei isso tão bonito! Te admirei tanto que comecei a te ver como o herói que nunca erra. Aí veio aquela senhora chamada "Vida" e me mostrou que nem sempre eu poderia te chamar. Me mostrou que, por mais largos que seus ombros fossem, eles não me aguentariam para sempre. Então tive que caminhar com o coração nas mãos e ter como conforto o silêncio de um espírito que chora.
Tive que criar "Costume" com as coisas e com as situações. Eu não gosto dessa palavra, pai! Não gosto de ter que me acostumar. Não gosto do peso que o mundo joga sobre minhas costas.
Talvez eu tenha mais de você do que imaginávamos, talvez sejamos teimosos, insistentes e trabalhosos, mas hoje tudo o que queria era um abraço seu. Eu sou assim mesmo, sou como um passarinho que precisa voar livre. Mas eu sempre volto, eu prometo, paizinho. Eu prometo.”

Carta de uma confusão

quinta-feira, 5 de julho de 2012


    Hoje o sorriso das pessoas está me ferindo de alguma forma que eu diria desconhecer. Sinto algo em meu peito que não sei descrever. Minha vida está equilibrada. Equilibrada porque se alguém a analisa, diz que tenho tudo que preciso. Eu mesma não sinto que algo falte. 
    Me desapeguei de algo que deveria desapegar, me refiz, me completei e abri meu coração à vida. Vida tal que hoje estou incapaz de sentir.
    Angústia, tão amarga... Estes sorrisos ilusivos. Por que me ferem tais, por que me machucam? A vida é efêmera, a vida por si só me fere. Não tenho medo de morrer, mas de viver, na maioria das vezes, sim.
    Futuro, existe algo mais assustador do que tu és? Porque me roubastes tantas coisas e trocastes teu nome para "Presente", trazendo-me coisas novas e que sim, por vezes até agradáveis, diga-se de passagem; mas por alguma razão obscura e melancólica, vivo apegada ao nome que tens e que habita no ontem: Passado.
   Tempo... Tão confuso. Será que ele passa ou nós passamos por ele e somente isto? Mudaram as estações, mas o que é atemporal ficou. Será que sou atemporal? Se sim, para onde é que vou depois daqui? 
    Meu espírito quer ser livre, hoje sinto as prisões do meu corpo, e meu corpo chora as repressões de uma sociedade corrompida por sistemas que há muito falharam e existem apenas para destruir pessoas com espíritos bons.
    Eu e o meu discurso incompreensível de não habitar aqui, de não entender o que se propõe e de viver a ideologia de ser livre. Embora saiba que liberdade é tão utópico quanto os sonhos mais indescritíveis que guardo em mim.

"And i know it's a wonderful world
But i can't feel it right now
Well, i thought thad i was doing well, but i just wanna cry now."
James Morrison, Wonderful World


23.06.2012
Uma tarde angustiante, qualquer e incomum.

À um lado meu que vive em outro corpo.

terça-feira, 3 de julho de 2012

Oi. Não sei como começar isso, rs. Sabe o que é? Tenho muito a dizer, mas não sei se tenho coragem. Olha, é raro me ver reconhecer covardia, isso mostra que estou indo longe. Talvez eu tenha chegado em um ápice de saudade e cansaço tão extremo, que comecei a me perder.

Por falar em saudade, neste exato momento, estou tentando disfarçá-la ouvindo aquela música que aprendi no piano. Lembra? Eu sei que sim. Isso sempre foi coisa minha, até eu descobrir a sua existência. Quando descobri que você existia, todas as minhas manias passaram a ser suas também. Tudo o que eu fazia pra passar o tempo agora tinha uma conotação diferente, pois trazia seu rosto à minha memória. Sem que eu percebesse, você estava presente em qualquer coisa que eu fizesse...

Como isso é possível? Como duas pessoas podem ser completamente iguais e, ao mesmo tempo, conseguirem se completar de uma forma tão perfeita? Como podem ser lados opostos sendo um único ser? E como pode uma pessoa viver em dois corpos?

Uma vez eu li isso: "Você é o brinquedo caro e eu, a criança pobre." Ainda assim, me sinto diferente agora. Consigo te ver como brinquedo caro, mas não me vejo como criança pobre, - não por mérito meu - você nunca permitiu que eu me sentisse menos do que especial. Me vejo então, como a criança que o viu na vitrine, encheu os olhos de brilho, chegou em casa e pediu dinheiro ao pai. Quando voltou à loja, porém,  era tarde. Alguém já tinha levado o brinquedo embora. Não havia previsão de quando chegaria algo parecido. E eu fui pra casa sem saber perder. Sem querer comprar outro brinquedo, querendo aquele, só aquele.

Sempre fomos honestos um com o outro. Ultimamente a vida tem tomado um rumo que nos confundiu. O que fazemos agora? Começo a ficar com medo. Decidi seguir a minha estrada. Gostaria de ter você por perto, poder trocar informações, sei que estou exposta a quedas, mas talvez você não possa me carregar agora. Tudo bem, não lhe cobrarei. Não vou chorar também, você sempre disse que eu era forte. Eu aguento. Está tudo bem. Mas vê se não se perde, tá? Mesmo de longe, seu coração ainda é igual ao meu, e o meu, igual ao seu, e sempre vai ser assim.

Sob a Árvore

sexta-feira, 29 de junho de 2012


Oi, primeiro me perdoe, demorei muito para escrever. Admito que fiquei chocada quando descobri que era você quem estava por trás de tudo isso. Sempre imaginei que um dia pudesse a vir fazer isso mesmo, mas nunca esperei que fosse fazer de verdade. Na primeira carta achei que reconhecia aquele estilo de escrever, aquela forma de descrição... quis acreditar que não era.

Quando a segunda carta chegou eu já tinha me dado conta de que eras tu e me afastei, pedi para ser tirada do caso. Soube que pensou o contrario. Não. Dadas aquelas circustâncias eu não podia permanecer investigando. Disse, ao fim de todas as cartas que gostaria de me ver novamente na investigação. Por que se eu já sabia quem era?

A terceira carta recebi diretamente das mãos da menina. Ao terminar de ler sorri de canto e afaguei o rosto de Emilly. Assim como estava feliz em vê-la viva e, relativamente, bem, eu me preocupei com o que faria. Disse aos policiais para correrem, despachei ao mesmo tempo uma ambulância para o lugar que jovem ruiva descrevera. Por sorte lhe acharam vivo. Quando o rádio deu a notícia da sua captura me joguei ao sofá que há dentro do bureau observando o interrogatório dela até a chegada de seus pais... os olhos são lindos como sua descrição dizia que eram.

Depois que tive a certeza que ficaria preso, depois do julgamento, muito provavelmente em um hospital psiquiatrico recebi duas semanas de folga. Sabia disso também, não é? Pois deixou para a carta final no último dia, quando eu estaria voltando. Volto a pedir perdão, pois outros detetives acabaram lendo suas derradeiras linhas. Quando a noticia chegou à mim faziam algumas horas do ocorrido. Chorei dias seguidos depois de sua cremação. Coloquei as cinzas sobre a mesa de jantar e conversamos por horas... ao fim disso fui até aquela nossa montanha - o dia já amanhecia -, abri a urna vendo toda a cinza sendo levada pelo vento.

Agora estava livre. E eu, tranquila por estar livre. Plantei lírios aqui ao lado da árvore, sei que eram suas flores preferidas, deixo, junto às flores essa carta, sei que, onde quer que esteja, irá lê-la. Obrigada por tudo e espero que, um dia, Deus tenha a bondade e a piedade para que nos reencontremos novamente. Também lhe amo pai, obrigada por tudo.

Com amor, Margery.

Um bilhete colocado no meio do livro pra traduzir a saudade

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Que ligação louca é essa que a gente tem! Você consegue explicar? Parece ser de espirito, que a propósito, também tem sofrido com essa coisa dolorida, esse sentimento que eu não conheço bem...
Sabe, guri, um dia desses eu sonhei com você outra vez. O mesmo sonho: você me carregando naquela montanha, sorrindo pra mim. Que sorriso! Te encontrei, mas achei melhor não dizer nada. Achei mais conveniente ficar em silêncio contemplando a paz infinita do seu olhar. Preferi ouvir a sua voz em todos os timbres e tons, gravando cada um deles em mim. Você não faz ideia do quanto faz falta ter você aqui. Você não faz ideia do quanto eu preciso dos teus olhos de sol.
Não sabes? Tens olhos de sol. É o teu dom único de manter meu coração aquecido, de me tirar do inverno interior que vivi por tanto tempo.
Não quero estender mais este bilhete, só queria te ver sorrindo ao abrir o livro e encontrar isso aqui. Escrevi mesmo pra te pedir desculpas por não ter conseguido responder quando você me perguntou o que eu sentia. Eu não sei o que sinto. Só sei que costumo te ver como uma parte de mim vivendo em um outro corpo. Só sei ter saudades.

 Fique forte como sempre foi, combinado?
"And I will try to fix you..." 

 Com carinho,
Branca.

Não apague as luzes, não me deixe aqui...

sábado, 9 de junho de 2012

Tudo ecoava de forma diferente naquela floresta, como se o som do vento batendo nas folhas tivesse voz e todas aquelas árvores cantassem em coro os horrores que aquele lugar já havia visto. Eram ossos cobertos de terra, escondidos de maneira que jamais ninguém encontraria. E quem se atreveria a pisar ali? Eu fui por acidente, quando me dei conta, já estava perdida. Não deixei rastros, não marquei meu caminho, não sabia voltar.

 O baile dos tiranos começaria em alguns minutos. Tentei me preparar, mas não tinha roupa para aquela ocasião e, ainda pior: tudo o que eu tinha era aquela velha armadura que mais parecia feita de vidro, tamanha era sua fragilidade. Já nem sei mais se me servia de algo ou apenas acrescentava peso ao fardo que minhas pernas carregavam. Meus pés estavam descalços, eu tinha em mim a certeza de que não seria bem vinda. Antes houvessem tentando me expulsar daquele lugar... Que nada! Jogaram-me em uma cela, sozinha. Não foi como deve ser todo bom conto de fadas, onde a princesa é aprisionada em uma torre e salva por um príncipe. Ao contrário disso, minha prisão era subterrânea e eu não fazia ideia de quanto tempo levaria para que alguém saísse em meu resgate. Eu não sabia se alguém sairia em meu resgate.

 De uns tempos pra cá, tenho vivido em estado constante de outono, interiormente. Tenho caminhado, sem saber ao certo para onde meus passos me levam. Descobri em meu cárcere o que é temer a morte e agonizar em vida. Descobri que o silêncio e o frio sussurram a mesma canção entoada por aquelas árvores da floresta. Toda vez que o silêncio se chegava até mim, eu balbuciava em tom de suplica: "por favor, de novo não..." mas ele não me ouvia. Presenciei ainda uma terrível cena: vi a esperança ser violentada todos os dias pelos medos tenebrosos, sem conseguir escapar de seus braços, tão cansada que desistiu de gritar. Já não reagia mais, apenas esperava findar a tormenta para esconder-se novamente com suas vestes sujas em algum lugar onde talvez não fosse encontrada. Eu senti, naquela cela, a morte envolver-me como uma névoa. Deviam ter contado antes que as chaves estavam enterradas ali por perto. Mas olha, não buscarei por vingança. Sequer lembro como chegar até lá! E tome por aviso: não deixe de ler as placas.

Ao nosso amor sujo, à nossa atraente loucura



Saudade de receber você no início da noite alterado pelo seu verde tão natural, dos olhos e da planta. Que te fazia mais fora de si do que era de costume; sentava-se ao meu lado na varanda ou em praia deserta e conversávamos com música. De melodia em melodia: nossa paixão. E se eu quiser, ouso chamar de amor.
Amava te amar com meu corpo. Sentir o seu sobre o meu, seu respirar. Seu cheiro de planta queimada, seu hálito no meu, nosso calor. E nós alternávamos entre uma conversa e outra, um beijo e outro, uma música e outra, e palavras incompreensíveis, assuntos que não faziam sentido algum. Mas nós entendíamos e era a vida que eu quis. Procurando vaga uma hora aqui outra ali no vai e vem dos seus quadris. Ultrapassávamos a madrugada e ouvíamos o galo cantar.
Noite e dia, lingerie de renda preta. Noite e dia, pele branca. Noite e dia, o reflexo da lua no meu corpo. O som do galo a cantar, o mundo inteiro acordando; nós, porém, indo dormir.
Todo dia é dia, meu bem, e tudo em nome do amor!




Pro  Dia Nascer Feliz, Cazuza: música inspiração.

Aos céus.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Acordei às seis da manhã, meu corpo continuava cansado, minha mente estava dispersa e, pra ser honesta, ainda está. Os pensamentos pareciam embalar uma valsa desordenada. Na noite anterior, o escarlate reluzente naquela taça parecia meu próprio sangue que fora perdido na guerra de manter-me viva. Era quase o sangue que corria em minhas veias, como a vida que se perdera. Eram insanidades feitas em líquido fino, em seda que se bebe. Deixei dentro daquela taça de cristal, alguns pequenos planos e sentimentos em troca da minha lucidez e vigor. Selamos então nosso pacto com um beijo.

 Logo nas primeiras horas deste dia, observei um céu que anunciava tempestade e algumas árvores distantes. Aquele cenário parecia me encarar com pesar. Decerto, também se lamentava pelo estado decadente da humanidade. Como alguém que fala mas não é ouvido. Como quem brada com trovões, mas em seu interior, há uma criança inocente de olhos marejados, entregue ao abandono e ao esquecimento. O dia é acinzentado, sem brilho algum. Vivenciando o luto por um povo cego em dores. O céu me olhava e confiava me contar suas tristezas, como gritava o meu coração, choramingando pelas prisões às quais era entregue. Assim também suspirava a minha alma, trocando confidências e buscando conforto. Até o verde opaco das folhas tentava contar histórias, mas tudo e todos estavam amordaçados. Silêncio. Chore em silêncio.

 Inunda mesmo essa terra, tempestade. Eu entendo. Eu vi, Criador e criação, chorarem juntos sem nem saberem mais a quem pertenciam aquelas lágrimas. Era só chuva. Porque me foi contado em segredo que o sangue derramado sobre este solo é o vinho oferecido aos céus. Pois então, que choremos em nossa embriaguez. Depois o sol aparece por trás de uma nuvem qualquer, o céu fica mais claro e abre um sorriso singelo como quem diz: "Já passou". É... temos muito em comum.

Aos Policiais IV - Epílogo

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Olá Margery, como está?

Fico feliz que tenha conseguido me encontrar a tempo. Creio que mais alguns segundos e todo aquele gás teria preenchido o ambiente, fatalmente, me matado. Não soltei o doce aroma da morte para me punir pelo que fiz, uma especie de redenção. Não... longe disso. Quando vi aqueles de olhos de Emilly fui tirado da minha tranquilidade, da paz de meus atos, aqueles olhos me inquietaram, me trouxeram a tona um reflexo de outros olhos repressores, sim, os teus olhos, Margery, reprimindo meus atos, reprimindo minha conduta, meu modo, meu jeito. E quem sou eu para ir contra aqueles olhos? Aquele tom de voz? Aquela forma de se mover? Decididamente eu sou refém de olhos como aqueles...

Peço-lhe que poupe os psicologos, analistas e todos os profissionais dessa área de virem até minha cela. Não tive motivação na infancia traumática. Não tive desilusões amorosas. Na verdade não tenho nada que justifique meus atos. Apenas queria sentir o gosto de ceifar a vida de alguém. Sem nenhum porém ou qualquer coisa que o valha. No entanto, lhe digo para não mostrar essa carta à ninguem. Não estou disposto a ser imitado por qualquer doente mental.

Lamento apenas uma coisa: não ter recebido um último abraço teu. Uma última demonstração de carinho. Triste esse final, não é algo que eu tenha planejado. Porém nem tudo sai como planejado todos os momentos, não concorda? Assim como aquela despedida não teve flores e abraços, decidi que esta também não teria. Faço votos para que se cuide, seu futuro é brilhante e extremamente promissor onde quer e com quem que esteja.

Com amor, seu pai,
Anthony.

travesseiro

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Confesso que chorei lendo sua carta, uma, duas, três, quatro, cinco... até cair no sono, dormi sobre a mesa, acordei com o papel ainda grudado em minhas mãos. Na hora que acordei dei graças que escreveu a lápis. Sério. Se fosse a caneta seu choro teria borrado toda a carta, assim não... Eu não vou dizer que é um monte de asneiras, porque não é... eu meio que te entendo, de verdade. Lembra? Eu posso sentir como se sente, eu sei como se sente assim como sabe como eu me sinto!

Em meio as lágrimas ainda, troquei de roupa, peguei as chaves do carro e aff, que trânsito. Podiamos nos mudar pro interior, lá não tem trânsito. Enquanto parei no meio daquele monte de carros podia notar tudo estranho, o dia ainda estava meio escuro. Liguei o rádio, só tocavam noticias em quase todas as emissoras. Suspirei abrindo o porta-luvas procurando algum CD ou pendrive pra ligar uma música e a sua carta caiu em minha mão. Como ela veio parar aqui? Acho que na hora que recolhi a chave peguei a carta junto.

O trânsito não dava sinais de que ia se mover. Me estiquei um pouco, dois carros tinham batido uns 100 metros pra frente e fechavam a rua toda. Não aparentava gravidade, mas aparentava que ia demorar. Desdobrei a sua carta e li de novo sem ler. Sabe como é isso né?! Eu já sei as palavras, já sei a ordem de tudo e mesmo assim a cada vez as palavras são diferentes, cada vez ouço uma entonação diferente da sua voz... sabe aquelas cartas de filmes que o cara pega e uma gravação lê a carta? É assim que li ela duas vezes no trânsito (eu ia ler a quarta, mas uma buzina me mandou ir adiante) e suspirei.

Quando entrei olhei o relogio do celular, era muito cedo, lembrei da sua frase "estarei amanhã cedinho, te esperando lá em casa pro café da manhã (mas se vier cedo, prepara e me chama, sabe como sou pela manhã ¬¬)" e resolvi preparar o café. Quando terminei de passar o café - mesmo que eu não goste de café, sei que gosta - corri na padaria ali embaixo, comprei pão fresquinho, queijo, uma maça e um mamão... quando voltei escrevi essa carta que estava em seu travesseiro e, agora, esta em suas mãos. Quando terminar de ler pela segunda vez (lembrei do lance de termos muito de numero 2 em nossas vidas) desça as escadas. Shiuuuu, sem reclamar. Ah, coloca um roupão por cima do pijama, ta meio friozinho hoje... e vem tomar café comigo aqui na cozinha. Preparei algo especial, porque todo dia contigo é especial. Te amo!

Aos Policiais III - Final

terça-feira, 22 de maio de 2012

Olá senhores policiais. Não vou perguntar como estão, sei que agora estão bem. Agora que Emilly está em segurança dentro dos seus dominios. Claro, de praxe encaminharam-na para um hospital afim de fazer nela inumeros exames, compreendo os senhores. Mas digo que não é necessário, devolvam à ela o convivio com seus familiares o quanto antes, creio que esta experiência lhe foi traumática ao extremo e isso a fará passar por terapias por anos. Porém melhor assim não?!

Devem agradecer à essa jovem de cabelos rubros por esta carta chegar às suas mãos com ela ainda respirando. Vou lhes contar o objetivo inicial: sim, era mata-la. Da pior forma possivel, a deixaria sangrar por algum tempo, ver toda a pele dela esbranquiçar... no entanto não fui capaz quando vi nos olhos dela algo que só tinha visto nos seus, Margery, ela não demonstrava medo, pelo contrário, demonstrava uma... fúria talvez? Não, era algo mais sublime, mais... mágico! Os olhos dela desafiavam-me a fazer o que eu planejava. Nesse instante a adaga caiu de minha mão fazendo o barulho de um metal quando toca o chão descendo de altura maior que um metro.

O instante seguinte foi como se eu acordasse de um sono muito grande. Não, não me arrependo do que fiz. E não, não fiz absolutamente nada fora de mim, em um estado de insanidade temporário. Lamento aos senhores advogados se pretendiam alegar insanidade, tudo que fiz, fiz completamente dentro de minhas faculdades mentais normais. Desisti dela. Os olhos dela me pararam. Será ela um sinal? Margery... será?

Quando aproximei o pano com formol do rosto de Emilly ela me questionou o porque daquilo. Disse que precisava de um instante a sós comigo mesmo. Disse-me que se fosse para morrer, queria que fosse olhando nos olhos do seu assassino. Afaguei-lhe os cabelos, não a mataria. Pedi desculpas e coloquei o pano sobre seu nariz e boca. Ela não relutou, apenas as palpebras pesaram e ela adormeceu, serena e a respiração ficou calma. Só a vendo assim é que consegui escrever esta carta.

Peço-lhes que não a interroguem. O retrato falado dela não é importante. Após essa carta Margery já saberás quem sou. Aliás, desde a última carta ela já sabe, apenas não tinha confirmação. Agora tens Margery. Estou lhe esperando, venha me buscar. Espero que chegue a tempo de me pegar. Torço para que consiga.

Até, espero, breve.
Sem assinatura, pois Margery, ao fim destas linhas, saberá que sou eu, e só isso importa.


ps.: encerro assim essa pequena trilogia, não haverão mais mortes, não da minha parte, creio que alguns imitadores poderão surgir, mas os pegarão logo. Confio nesse departamento de policia e nos seus competentes integrantes.

Aos Policiais II

sábado, 19 de maio de 2012

Olá, novamente, senhores policiais, como vão?

Primeiramente me perdoem pela última carta que deixei, sobre Ania. Depois que acharam-na eu não consegui me consolar por não ter me identificado. Prometo que, ao fim desta, eu assinarei. Deixem-me falar de Chirstine, não que eu seja desse tipo de pessoa, mas ela merecia o fim que teve. Não desta forma abrupta. Mas merecia. Por que? Elementar meus caros policiais. Ela cometeu diversos crimes que virão a tona quando a morte dela ser conhecida por todos. Minha sugestão é que comecem a investigar a apartamento dela, sobretudo o quarto, creio que acharão algumas coisas realmente intrigantes no lado esquerdo, ao pé da cama. Porém não fiz o que fiz afim de fazer justiça com minhas proprias mãos. Longe disso, escolhi Christine no mesmo acaso que escolhi Ania.

Novamente lhes digo para não gastarem os preciosos recursos do departamento com exames de estupro, não fiz isso a primeira vez, não o farei agora. Lhes conto detalhe por detalhe, estragando assim a diversão dos senhores peritos: como bem sabem Christine mora em um edificio antigo, muitas pessoas de idade moram ali, portanto os corredores, elevadores e portas foram adaptados para cadeiras de rodas, muletas e, assim, melhorar a assessibilidade de seus moradores. No entanto creio que não se interessam pela arquitetura do prédio, não é mesmo? Porém esta pequena explicação era necessária, tendo em vista o meu modus operandi compreenderão o motivo mais adiante.

Christine morava no sexto andar, para traze-la até aqui eu precisaria dopa-la. Porém como arrastar uma pessoa pelo hall de entrada do prédio sem chamar a atenção? Quando a peguei de surpresa na entrada do apartamento fiquei com essa dúvida por quase uma hora. Foi quando notei que haviam muitos enfermeiros que entravam e saíam dos vários apartamentos em intervalos regulares. Deste instante em diante só necessitei de uma cadeira de rodas e um jaleco branco, cobri o rosto de Christine a colocando na cadeira... o porteiro foi até gentil em me abrir a porta de saída, ofereceu ajuda para leva-la até a ambulância... será que tenho rosto tão bondoso assim? Provavelmente meu disfarce enganou o simpatico porteiro. Creio que interroga-lo não trará nada novo à investigação.

No instante que saí do prédio sem nenhum problema me senti vitórioso. Devo dizer, sem falsa modéstia que fiquei um pouco convencido de minhas capacidades depois de tal fato. Porém logo me acalmei e trouxe Christine até aqui. A amarrei e esperei pacientemente que ela acordasse. A forma que ela olhou em meus olhos, o medo estampado naqueles olhos era algo incrivel, e eu era o gerador do medo nela. A acalmei. Quando senti que ela estava mais calma lhe soltei uma das mãos - a direita. Percebi alguns segundos depois que não deveria ter feito isso. Pois ela veio direto à minha pele me causando um arranhão. Espero que eu tenha conseguido lavar as mãos dela afim de tirar qualquer pista da minha pessoa que possa ter ficado nas unhas dela.

Creio que não há necessidade de me ater aos detalhes, da forma que a luz, o medo se apagou nos olhos dela. Pude ver segundo por segundo, em Ania não pude ter esse gosto, os olhos dela se reviraram e se fecharam, com Christine foi diferente, eu colei as palpebras dela abertas, assim pude vê-la virar os olhos tentando desesperadamente fecha-los. Fui cruel, admito, mas eu queria ter essa sensação. Queria ver como é o fim de perto nas retinas de alguem. De certa forma devo agrader à Christine em me dar tal sensação. Claro que, assim que tudo se apagou nela, não fui insensivel ao ponto de deixa-la de olhos abertos. Os fechei e fiquei admirando-a um instante a mais. Obviamente ela não merecia tal contemplação pós-morte, mas fiquei tentado em faze-la... Assim lhes entrego a segunda carta. Na próxima espero não me demorar tanto na descrição da vitma e de como agi, ocorreu que nesta eu precisava desabafar com alguem, me vangloriar com alguem. E, que bom que é com os senhores, senhores policiais.

Margery, peço que não fique chateada. Também fiquei triste quando soube que lhe retiraram das investigações, porém não vejo motivo para tal ato, temeram por sua segurança... eu jamais lhe atacaria, não tenho planos de que sejas minha vitma. Mesmo que eu escolha as vitmas aleatóriamente, no hipotético caso de ser você eu, sem hesitar, iria para o nome seguinte. Senhor delegado, por gentileza coloque Margery de volta nas investigações, sim? Ela estava com progressos que devo dizer serem interessantes demais para descarta-la assim.

Agora, confome o prometito no inicio desta carta, lhes direi quem sou, no entanto me resguardarei em dizer meus motivos. Pensem bem, já ofereci diversas informações sobre quem sou. Afinal, quem mais conseguiria informações que compartilhei com os senhores nos paragrafos anteriores? Creio que agora estão pensando que sou algum policial, alguem ligado às investigações... não. Não sou. Também não sou nenhum jornalista.

Enfim, creio que me prolonguei demais nesta carta. Até breve, senhores policiais e senhorita Margery - que espero que esteja reintegrada à investigação até a próxima carta. Cuidem-se, nos vemos em breve.

Edgar A. P.

aos policiais I

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Olá senhores policiais, espero que esta carta vós encontre bem. Ah sim, transmitam minha mais sincera saudação àquela jovem policial loira que achou meu ultimo trabalho. Como ela chama? Margery não é? Bonito nome, caso um dia eu venha a ter uma filha darei o nome dela. Muito sonoro, muito significativo. Enfim, sem devaneios vamos ao que interessa.

Espero que tenham encontrado Ania não muito tarde, afinal, odiaria ver a familia dela velando um corpo já em estágio de decomposição avançado, seria tão desagradável, tanto à familia quanto aos agentes funerários que irão embalsamar o, belo, corpo dela. Porém se meus calculos estiverem certos encontraram ela após sete ou oito dias do sumiço dela. Como ela só sucumbiu ao fim do sexto dia, deve estar com a pele fresca, um pouco pálida por tamanha perda de sangue, mas ainda assim manteve sua aparência normal à todos antes de desaparecer.

Permitam-me lhes contar um fato incrivel: Ania era uma moça incrivelmente forte e determinada à escapar de meus dominios. No entanto, como podem ver, não há muito para se ir daqui certo? Mas, por via das dúvidas eu engessei as pernas dela. Assim ela não pode correr. Receio que os peritos olham com estranheza para aquele fragmento branco na perna, é gesso cirurgico, igual aquele de quando nossos filhos quebram braços, pernas em suas traquinagens rotineiras. Peço que não gastem preciosos recursos da corporação fazendo exames de estupro, jamais estupraria alguem. Sei que farão o teste assim mesmo, mas volto a frisar: é recurso do cidadão jogado fora. Acreditem em mim. Ou não. Até a próxima senhores policiais, até breve, Margery.

amanhecer

domingo, 13 de maio de 2012

Bom dia meu amor, primeiro me desculpe por não acordar ao seu lado, hoje tive que sair mais cedo, resolver uns assuntos no centro... se estiver lendo isso é sinal que não consegui voltar a tempo. Que droga. Sei que não é a mesma coisa, mas estou com o celular, se quiser me ligar agora, pode ligar viu? Se eu não atender é porque estou sem sinal, essa nossa operadora de celular é ótima nos gastos mas fica devendo no sinal né?! Aff. Não se preocupa com o almoço nem nada do tipo, vamos almoçar fora hoje... não se importe com o dinheiro, a gente sai correndo e tudo certo ok?! hahahaha

A verdade é que, enquanto escrevo essa carta/bilhete eu te vejo dormir, tão serena, tão tranquila, com um sorriso tão lindo, uma aura tão viva e brilhante... tão diferente daquela que eu vi aquele dia no seu trabalho. Me sinto bem em saber que fui eu o responsavel disso. Eu fico feliz em te fazer feliz, shiu, sei que vai balbuciar qualquer coisa agora. Quieta, continua lendo/me ouvindo, só por enquanto, pode ser?! Ótimo.

A verdade é que eu fiquei imensamente feliz com seu pedido, sério, se na hora eu ficar sem chão foi porque me pegou de surpresa. É a realização de um sonho sabia? Até estava comentando dia desses com nossa prima coisas completamente viajantes, como os detalhes do casamento que teria/terá que ser numa igreja com orgão (aquele tipo gótico) pra minha entrada triunfal, pra sua entrada triunfal, pra nossa saída triunfal.

Já deve ter percebido, mas estou sem unhas. Culpa sua ok?! Ando roendo tanto as unhas que, quando dou por mim, eu já estou roendo a carne rs.

Fica na cama até eu chegar, vou adorar chegar e te ver ainda meio dormindo, entrar de mansinho por baixo das cobertas e te ver acordar de novo.

Te amo meu amor, muito e tanto.

Calei-me

terça-feira, 8 de maio de 2012

De umas noites pra cá, tenho lido todas as cartas que escrevi mas nunca foram enviadas. Talvez por medo, talvez por orgulho, ou talvez pelo conteúdo ser tão dolorido. Todos os dias costumo dar uma folheada no passado antes de dormir, então percebi que aqui dentro o tempo parou. Meus relógios internos além de estarem sem pilha, estão quebrados também. Tudo está um pouco quebrado, um pouco fora do lugar...
Eu tenho tentado forjar alguma força na expectativa de que isso te traga pra perto e te mostre que eu consigo estar com você, mas penso que agi errado. Eu deveria ter deixado escapar aquele choro dizendo "não vá" enquanto estávamos ao telefone. Eu deveria ter dito que sem você o meu sorriso é a maior das mentiras, eu deveria ter dito! Sei que o amor deixa livre, mas acho que seria melhor ter te prendido a mim naquela época. É injusto deixar algo tão verdadeiro tornar-se apenas história. Nunca consegui aceitar.
Tentaram varrer os farelos de esperança dentro de mim, mas não resolveu. O problema é: quando a gente espera por algo que não acontece, esses farelos começam a virar cacos de vidro que vão cravar mais fundo a cada passo dado.
Queria mesmo que você ouvisse o meu coração tal como desejo ouvir o seu. Talvez ele te explicasse as coisas que eu nunca consegui expôr. Ele poderia deixar escapar essa frase que enterrei viva, esse algo que me é difícil até de escrever. Esse... esse "eu te amo".


 Provavelmente, mais uma carta que nunca terei coragem de te mostrar. 
O orgulho amarga a alma, mas o amor... este explode sem querer.

 eu   
amo 
  você 
pra sempre, como prometido.

Retorno

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Eu sei que pedi que se afastasse, que me deixasse, que, por ora, nossos caminhos iriam se separar... No começo desse afastamento, fui forte, recebi inumeros elogios de alguns amigos "você conseguiu, viu como você é forte?!", elogios de como eu era forte por estar bem apesar dos pesares... enganei a todos! Se eu aparento ter superado é porque sei disfarçar bem, sei mentir bem. A verdade é que, hoje a tarde, enquanto passava perto de onde trabalha (na verdade passei bem em frente, em baixa velocidade) eu te vi. E não gostei do que eu vi... não vi seu sorriso, não vi aquela sua aura brilhante em volta de ti... quer dizer, ela estava lá, porém opaca, bastante apagada.

Não sei como consegui guiar o carro até a nossa praia, lá liguei o rádio afim de espairecer. Meu plano durou poucos segundos, logo começou a nossa música, cantei junto ela inteira, depois, me debrucei no volante e chorei, perdi a noção do tempo que fiquei lá. Sei que pedi que fosse, sei que fiz uma escolha, porém agora quero desfaze-la. Mas agora quero recomeçar do zero, dessa vez com mais solidez, as paredes de tijolos mais firmes, o muro de pedras... Será que ainda tenho esse direito? Tomara.

Com amor, Michael.

Para sempre sua.

sábado, 28 de abril de 2012

Amor, resolvi mandar todas as cartas que guardei por anos, e junto dessa, que será a última. Perdoe-me pela covardia de me esconder atrás de palavras que jamais pude pronunciar, atrás de atitudes e fatos que nos separaram e dividiram o amor que outrora foi tão único e ardente. Imagino que você esteja me odiando por nunca ter te procurado após aquele dia. Dia deplorável, me arrepio apenas de lembrar. Eu não queria ter dito nada daquilo, mas foi preciso. Eu sinceramente espero que você entenda, porque, bem, não tenho muito tempo. Tenho muitas lembranças suas, foram dois anos majestosos, dois anos que me salvaram a vida. Mas errei com você, pois fui injusta. Fiz o que jamais poderia ter sido feito. E sinto-me, por isso, a pior criminosa possível! A mulher mais indigna de ter o seu amor, e o tive, por isso aceito seu ódio. Devo aceitar. Não sei se para o meu crime existe perdão... O filho que eu estava esperando, era verdadeiramente seu. Aliás, hoje ele é um menino lindo, terça-feira completará cinco anos, (sinto um frio na espinha por imaginar esse dia que para mim será sempre tão distante), e ele anseia por te conhecer... Eu fiz tudo errado, me perdi nos meus medos. Mas nunca ousei te substituir, saiba que nosso filho só tem um pai, e é o destinatário dessa carta. Ele te admira, amor, assim como eu admiro. E ele te ama, sempre pergunta quando poderá te conhecer... E é por isso que busquei coragem e segurei minhas feridas para te escrever definitivamente. Como eu disse, não tenho muito tempo. Acho que você vai gostar de conhecer o seu príncipe. Não sei como está a sua vida agora, se existe alguém... Mas espero que não deixe nosso filho. Não por mim, mas por ele. E que me perdoe, eu sou indigna e injusta demais por ter afastado seu bebê de você. Por ter acabado, matado, massacrado o nosso amor da forma que fiz. E pior, por estar te contando por meio de uma carta! Eu gostaria de poder te encontrar, mas não quero que me veja da forma que estou... Acabada, envelhecida. Meus 27 anos retratam uma mulher bem mais velha, por causa de algo que nunca tive coragem de te contar. Eu deveria ter sido justa e não ter me envolvido com você. Mas me envolvi e só tive noção do que estava fazendo, quando já te amava. E quando você me pediu em casamento, percebi que eu não poderia fazer aquilo contigo. Eu tinha apenas mais um ano de vida. Minha gravidez era de risco. Mas os médicos erraram... Descobriram um tratamento novo e cá estou eu, após cinco anos, com nosso filho brincando no tapete da sala, te escrevendo mais uma carta - pra dessa vez ser enviada. Não tive coragem de te procurar para retirar tudo que eu havia dito e feito, mas tudo era mentira e foi mais fácil aceita-las como verdades... “O filho não era seu, eu tinha muita vida pela frente, eu não poderia me casar com você, e era favorável que você me esquecesse definitivamente ou, ao menos, que me deixasse em paz.” Após aquele dia, eu desejei morrer a cada manhã. Maldita doença! Nunca souberam ao certo o que era, mas souberam que eu não teria tempo. E bom, como eu já disse várias vezes aqui, hoje eu realmente não tenho. Meu estado de saúde realmente degradou. Toda noite tenho passado mal, meu filho tem ficado com minha mãe para não me ver assim. Hoje retornei do hospital, onde fiquei nos últimos dois dias. Voltei para a casa por não haver mais o que fazer, e se é para esperar a tão soberana morte, que eu a espere aqui, em casa, e que cumpra a missão de te dar ao menos uma vez, a chance de saber que foi amado. Verdadeiramente amado, com toda minha força, com toda minha vontade de viver. Que foi a esperança e a salvação que há muito não tive e que me deu o melhor presente que eu poderia ter, e a este dei o seu nome. Você me fez mãe, me fez mulher, realizou todos os meus sonhos de uma vez. Quis passar a vida comigo, mas eu fui cruel. Talvez mais cruel do que a minha própria doença, essa que me acaba com os dias, essa que me faz perder as noites de sono, essa que me arranca brutalmente a vida e o chão. E eu te dei adeus, mas minha vontade era de te abraçar comigo e não te deixar ir... Espero que você tenha uma família, e que nessa tenha espaço para o pequeno Samuel. Espero que você de alguma forma tenha boas lembranças minhas, eu jamais quis te magoar, embora tenha feito. Pedi para que minha mãe te entregasse as cartas quando eu não estivesse mais aqui, eu não suportaria encontrar você e olhar dentro dos seus olhos, e saber que seria a sua última lembrança minha. Então, se você a estiver lendo agora, quando se sentir pronto, pode ligar para o número dentro do envelope desta carta. É da minha mãe, e ela lhe apresentará o Samuel. Espero que você esteja pronto até terça feira, para que a tristeza dele ter me perdido seja substituída pelo ganho que será ter você. Bom, se você sentir meu cheiro ao cerrar os olhos, saiba que eu realmente estive aí, te abracei, e parti. Para além da vida, além de todos. E lembre-se, eu nunca deixei de te amar.

 Da eternamente sua, 
      Eduarda.

O reflexo daquele rosto

quinta-feira, 19 de abril de 2012

"Você precisa ficar bem e ser forte, Leonardo. Faça isso por nós, meu amor." - Disse ela, sorrindo enquanto acariciava meu rosto. Ela é Ruby, minha atual companheira que muito me faz bem na maior parte do tempo, confesso que seria perfeito se eu não tivesse meus bloqueios...
Instantaneamente, ouvi um grito interno dizendo: "NÃO! Eu não quero." Era o meu coração relutando contra a minha mente.

Eu tentei dizer que a amava, tentei fazer com que isso soasse sincero, tentei fazê-la sentir-se segura enquanto estava em meus braços, tentei - e ainda tento - deixar esse amor crescer em mim. Nunca desejei vê-la chorando por atitudes minhas, só que os dias estão passando e o tempo não está cumprindo com a sua função de apagar as velhas memórias. O rosto de Elisa continua intacto em minhas lembranças, ainda posso ouvir o som de sua voz quando fecho os olhos. Ouço sua respiração leve... É como acreditar no irreal. Sinto-me vivendo em um mundo completamente paralelo, ela não está mais aqui. Eu preciso seguir com a minha vida, ouço isso o tempo todo, mas continuo preso ao passado. Continuo preso a ela.

Eu nunca quis tentar encontrar a Elisa nos abraços e beijos de Ruby. Não queria ter comparado as características, não queria ter tentado esconder a falta que eu sinto de Elisa no amor tão verdadeiro que Ruby tem por mim. Eu quero cuidar de Ruby, tal como ela merece. E que fracasso tenho sido! Se fosse Elisa me dizendo: "Fique bem por nós, Leonardo", talvez eu não esperasse mais do que dois minutos para começar a mudar e tentar ver as coisas por outro ângulo. Seria inconsciente, eu nem lembraria do quanto Elisa já me feriu, não me lembraria do quão sozinho ela costumava me deixar! Simplesmente o faria, sem questionar.
E quanto a Ruby? Ela sim merece toda essa dedicação. Ela merece o lado bom do Leonardo, como se todos os dias ela tentasse trazer à vida os fragmentos de ternura que Elisa pisou com a ponta do salto. Por Ruby eu não tenho vontade de ser outro, ou talvez até exista alguma vontade, mas não há força. Não há aquele "algo mais" que havia. Sinto-me doentio e masoquista. Ela não merecia apenas as minhas palavras, merecia ter o meu coração, porém esse há muito já partiu com outra.

Espero que Ruby consiga me consertar. Que Ruby me faça humano outra vez.

Sei lá, eu precisava colocar isso pra fora.

Do Front

domingo, 15 de abril de 2012

Brest, França, 15 de abril de 1941.

Olá meu amor, como está? Por aqui tudo segue como sempre... a chuva parece incansavel em nos castigar, é como se os céus não estivessem de acordo com o que fazemos. Talvez ele esteja certo afinal.

Hoje o dia foi tranquilo, depois da batalha de ontem tudo tranquilo... ontem foi um marco em minha vida Sophia, hoje eu matei um homem, tudo bem, ele queria me matar também, a cidade é alguma ao sul de Paris, me falaram o nome da cidade, mas eu não consigo parar de pensar naquele homem, ele deve ter sua familia, seus entes queridos... o capitão me falou para não pensar

nisso, confesso que está sendo dificil.

Amanha vamos até Rennes, há uma base lá que precisamos nos infiltrar e conquistar, eu espero ficar apenas na retaguarda, sem precisar atirar novamente... ainda sinto o cheiro da pólvora em minhas mãos. Como a água é racionada não posso lavar tanto a mão quanto gostaria, na verdade tudo aqui é racionado... pensar nisso me deu uma saudade de nosso sítio. Como andam as coisas? Espero que tenha conseguido ajuda para colher a plantação... me falaram que as cartas saídas

daqui levam quase 2 meses para chegar ao seu destino... até lá já vai ter colhido toda a plantação e vai estar pronta para levar até a cidade vender. Cuidado com o seu Waldir, ele vai querer pagar uma ninharia pela safra! Não deixe! Barganhe bastante antes de fechar o negocio... e uma dica: ameace vender para outro comerciante qualquer. Ele vai aumentar o preço!

Diga a nosso filho que eu o amo e que logo estarei de volta para vê-los, abraça-los... sinto muita saudade de vocês todos!

Até breve

com amor
Antônio.

Liberdade

quinta-feira, 15 de março de 2012

Olá meu bem, espero que essa te encontre bem.

Como está o Duh? Grandão eu aposto! E aquele seu problema nas costas? Já foi ao médico ver o que era? Mandei que minha irmã te levasse o dinheiro pra que fosse em um médico particular, espero que esteja tudo bem por aí... aqui?

Aqui os dias não mudam muito, todos os dias vejo o sol em um horário certo, almoço, janto e trabalho nos horários fixos... graças à esse trabalho aqui dentro o promotor disse que vai falar com o juiz para rever a minha pena. Finalmente vou provar pra todo mundo que eu não tive culpa, que aconteceu tudo por acidente, por engano.

Sinto saudade de seus abraços, de seus beijos, de ouvir sua voz antes de dormir, de jogar bola com nosso menino, de ensinar pra ele a chutar uma bola, a andar de bicicleta, a (não se zangue comigo) como paquerar uma menina. Como ser respeitoso com os mais velhos...

Espero logo poder matar todas essas saudades e voltar logo pra casa!

Com amor, Marco.

Já se tornou questão de sobrevivência.

terça-feira, 6 de março de 2012

Dia após dia tenho percebido o quanto eu preciso de você. Eu tento me distrair, dar uma volta, rir das piadas dos outros, tento fazer amigos, ir ao parque, caminhar, comer porcarias, viajar, mas nada resolve. Tudo é momentâneo, basta alguns segundos e eu me lembro de você. Não é mais apenas um desejo, isso se tornou necessidade, uma necessidade assustadoramente dolorosa por não poder ter. Precisar e não poder ter. Você é a minha impossibilidade, ao menos agora. Eu não entendo os motivos disso ter que acontecer justamente quando eu mais preciso da tua companhia. Nem é mais novidade, todas as pessoas que costumavam estar à minha volta cansaram de ouvir coisas a seu respeito, mas existem detalhes que nunca foram ditos. Os detalhes que só nós conhecemos. As pequenas abstinências que cada pedacinho de mim tem de você são horríveis, me fazem querer sair de mim por ser tão incompleta.

Amor, você se lembra daquela vez em que começou a gear? Lembro de te ver achando graça porque a ponta do meu nariz estava avermelhada. Nós estávamos naquela pracinha perto de um restaurante onde tocava tango e, pra variar, você tentava me tirar pra dançar a todo custo, seu maluco! Isso ainda me faz suspirar, confesso. Era o nosso jeito estranho de nos divertir. Te ver sorrindo feito criança quando descobre algo novo valia a pena.
Lembro-me também daquela noite chuvosa em que eu te disse adeus e pensei que você me deixaria partir. Como foi bom deparar contigo no portão da minha casa me roubando um beijo antes que eu pudesse proferir qualquer palavra! Aquela noite foi assim, sem muitas palavras, o fato de estar com você bastava. Éramos um. Nós sempre estávamos em sintonia, sempre deixamos os instintos falarem mais alto. Como se todo aquele amor atravessasse nossos ossos e saísse por nossos poros. Quando você estava tão próximo que eu podia sentir o seu coração e o meu sincronizados, pulsando no mesmo ritmo... era perfeito. Você tinha o dom de estar com o corpo sempre aquecido, mesmo no frio. Tão único!
Hoje me permiti recordar cada insignificância que é bonita pra mim enquanto escuto aquelas velhas músicas que eu costumava cantarolar enquanto lhe velava o sono.
Ah, meu amor! Eu tenho tanta urgência em ser sua outra vez, em deixar esse amor que aperta aqui dentro simplesmente explodir. Eu preciso que o som da sua respiração seja a única canção que embala tudo o que sinto. Como numa dança lenta de passos exatos... onde tudo se encaixa.
Eu tenho urgência em sentir a tua vida, deitar sobre o teu peito e ouvir o teu coração bater. Eu, que te amo tanto! Eu preciso me esconder na tua pele. Preciso sussurrar os meus segredos, preciso te dizer pra não ir embora, porque estar aqui sem você é o mesmo que não estar aqui.
Se fecho os olhos, lembro do toque dos seus dedos mapeando meu rosto com cuidado; lembro da brisa fresca daquele parque em que nos vimos pela primeira vez.
Só me lembro, afinal, passou...
O ruim é que aqui dentro nunca passa.
Eu amo você.

Estação

segunda-feira, 5 de março de 2012

Olá meu Amor.

Hoje voltei àquela nossa pedra na beira da estrada, lembra? O movimento continuava igual, o dia não estava tão quente, resolvi caminhar até lá ver se nossos nomes ainda estavam gravados na pedra. Estavam. Lembra-se de quando os talhamos ali? Ficamos horas para fazer nossos nomes ali e as letras ainda ficaram tortas!

Quando terminamos apostamos em quantos carros passariam, os meus eram os vermelhos e os seus eram os pratas, você sempre ganhava, muito injusto! Quando dei por mim estava ali vendo os carros já tinham algumas horas, me levantei, passei a mão suavemente pela pedra e as letras dos nossos nomes, suspirei e voltei para casa a tempo de ouvir o trem apitando ao longe. Desviei do caminho e segui até até a estação, lá pude ver o trem ir embora, mais uma vez, impossivel controlar a vazão de lágrimas que me tomou. Quem estava na plataforma de embarque certamente pensava que eu tinha alguem muito querido partindo naquele trem. Mal sabiam eles que quem me era querida já partirá a muito tempo, porém, o som do trem sempre reavivava aquela sensação ruim e me pego pensando em quando será teu regresso.

Ainda agora olhei para o calendário, faziam alguns meses já e eu ainda sentia falta. A mão me treme a pena agora sobre o papel, melhor parar de escrever. Espero que fique bem e que voltes o quanto antes.

Com amor, eu.

Eis a minha resposta.

sábado, 3 de março de 2012

Eu sei que você tentou falar comigo um dia desses, mas desliguei todos os telefones, achei mais sensato ficar por alguns instantes, longe de tudo. Também achei coerente justificar-me ao menos dessa vez, tendo em vista que costumo sumir sem dar notícias.
Pois é. Quem diria que um dia o silêncio me seria mais confortável do que qualquer palavra?
É melhor assim. É melhor ter que parar, pensar e tentar resolver, do que agir segundo o que os outros acham correto. É melhor não precisar ouvir as "soberanas" opiniões humanas, como alguns a si próprios intitulam: "soberanos". Humanos! Pobres mortais, assim como sou! Um dia ousei valorizá-los mais do que valorizava-me. São apenas seres errantes, confusos, loucos e que ainda atrevem-se a dizer que são sábios.
De mortal louco por mortal louco... ouço a mim.
Ao menos responderei apenas por minhas loucuras, sentirei culpa apenas pelos meus erros. Eu prefiro a solidão do que ter por companhia um amontoado de palavras impensadas. Prefiro o tédio e o sono do que sentir a necessidade de castigar-me enquanto a insanidade reina, esbanja luxúria e se prolifera. É verdade que eu sempre tive uma fome absurda pelo improvável, pelo novo, pelo sobrenatural ou por qualquer coisa que tornasse o meu dia inacreditável mas, entenda: preciso estar só. Preciso que haja silêncio para que eu possa me ouvir. Ultimamente tenho tentado descobrir quem sou sem aquela maldita dependência. Tenho urgência em desfazer-me desse "alter-ego" que me fora desenvolvido de forma tão sutil. Preciso sentir a velha e angustiante abstinência que a distância proporciona.
Abstinência é isso: sofrer quando eu me dou conta de que já não tenho mais formas de fuga. Saber que chegou o momento de encarar os anseios e confrontar o meu interior sem camuflar algo. Sem poder escapar. Tudo ou nada. Matar meus impulsos ou ser morta por eles.
Não é questão de escolha, é questão de sobrevivência.

Não deixa esse "pra sempre" acabar, tá bom?

Há um ano atrás eu vi você pela primeira vez. Engraçado foi o percurso até a tua casa que é tão distante da minha. Eu estava dentro daquele carro, era pra ser só mais um passeio com os amigos, eu ouvia seu nome e ouvia poucas coisas a seu respeito. Imaginava que você não fosse gostar de mim e nem eu de você. Me perguntava o que eu estava fazendo ali, até descer completamente constrangida por não ter sido convidada. Então te vi sorrindo.
Passei o dia lembrando daquela primeira vez que eu fiquei parada te olhando, é como se ali, apesar de não saber, eu houvesse conseguido sentir tudo o que estaria por vir. É como se eu já tivesse vivido aquele dia em que eu cheguei perto de você chorando e você me abraçou dizendo que se precisasse ir até o inferno para me salvar, iria. É como se eu já houvesse te ouvido cantar, como se já tivéssemos trocado confidências, como se eu já tivesse te visto sangrar, como se já soubesse o quanto você era capaz de lutar, como se toda história que estaria por ser escrita já fosse conhecida pelo meu coração. E foi só a primeira vez que te vi!
"Já era amor antes mesmo de existir", lembra? Mesmo quando eu estou longe, continuo perto. Você sabe, nossos espíritos se comunicam. Seu coração conhece o meu e vice-versa.
Sabe o que me fez sorrir agora? Lembrar que você acordou mais um dia. Graças a Deus! Como eu sou grata por ter você aqui! Como eu sou grata por saber que você continua respirando!
Eu te amo tanto...
Faz um ano, mas é como se houvesse toda uma vida. É como se a nossa conexão já existisse antes mesmo de nós estarmos aqui. É de alma. Talvez seja por isso que eu preciso tanto te ver sorrindo, porque se você não puder sorrir com todo o seu ser, se o seu interior não estiver estabilizado e firme, eu também não posso. Eu também não consigo. É essa nossa ligação... Espero que esse fato não te preocupe, porque não fomos nós quem escolhemos assim, esse é apenas um presente que nos foi dado.
Que presente!

Algumas palavras 
1 ano depois de conhecer alguém 
que me ajudaria a carregar a pedra de uma forma 
tão doce.

Era segunda-feira quando...

quinta-feira, 1 de março de 2012

Lembra daquele primeiro abraço? Porque eu não esqueci. Eu estou aqui agora por causa dele. Talvez você reclame da sua falta de memória ou das minhas insanidades, talvez você não aceite os meus erros e talvez isso te faça acreditar que eu também não aceitaria os seus, mas que diferença faz? Nós somos assim. No fundo, eu sou exatamente igual a você. Posso dizer que não me importo, mas você conhece a verdade. Posso dizer que esqueci quando eu simplesmente não queria... Posso ser louca, você tem razão. 
Tão louca que continuo esperando chegar uma outra segunda-feira qualquer depois de um fim de semana completamente estranho para que eu possa te abraçar como se fosse a primeira vez. Pra que eu possa segurar a sua mão e dizer que vai passar. Pra poder chorar no teu colo. Pra viver tudo aquilo novamente e pra te pagar tudo o que eu devo, tipo aquela música que eu jurei te mostrar, mas nunca toquei. Como aquele passeio no parque perto da tua casa, e como todas as outras coisas que foram prometidas, mas não puderam acontecer. 
Não me cobre nada agora. Só me abrace, caso a saudade passar pela tua janela.

Ao túmulo

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Hora errada, lugar errado. Alguns segundos e tudo estaria diferente.
Você veio até minha casa, onde me encontrou chorando. Perdida em minhas próprias idéias, nos meus medos, nas minhas falhas convicções. E você implorou mais uma vez pra eu não deixar as coisas daquele jeito, pediu perdão! E eu ignorei o amor latejante e fui orgulhosa. Uma briga feia. Um adeus. E você partiu... Seu carro acelerado, outro na contra mão bate em cheio em você, se eu tivesse menos orgulho e mais honra aos anos de amor, você estaria vivo comigo. Agora quem vive sou eu, mas vivo a sua morte todos os dias quando acordo.

Três anos, eu e você; dois anos, eu sem você. Eternamente te amarei.

Flames.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Amar é mais que palavra. Amar é palavra e é atitude. Palavra porque se deve honrar, atitude porque se conjuga, é verbo. E te amo.
Talvez eu não possa demonstrar mais que isso, talvez tenhamos chegado ao nosso limite. Mas, meu amor, eu estarei a te amar.
Em silêncio, com outro alguém, ao admirar algum lugar. Eu estarei a te amar. E levarei você comigo, como o meu mais precioso segredo, como um bem enorme que carregarei. Vou ignorar aos demais, vou fazer uma utopia (e talvez não seja realmente saudável, mas já o fiz), vou ser apenas eu e você. E eu sei, não estarei sozinha, seu amor irá me acompanhar. Me ame em silêncio.
Feche seus olhos, me veja, lembre-se de toda nossa história, de todos nossos momentos e me ame. Apenas.

Com amor.

Feliz era uma vez, meu amor.

É bom ver que sobrevivi, me recuperei e hoje posso secar ao menos as lágrimas, que agora não mais são de desespero, mas de lembranças calmas.
Você pode ter outro amor e estar com ele agora, ter outro alguém em quem pensar, confesso que eu não tenho. E minha memória traíra, não me deixa esquecer de tudo e de toda nossa cumplicidade, e quando me recordo de toda riqueza, de todas as promessas, de todo calor, vejo que é muito para ser esquecido tão facilmente.
Talvez você esteja perdido em si, tentando manter uma fortaleza difícil de ser sustentada, e toda noite ao fechar seus olhos, lembre-se de mim. Ou ao menos quando penso em você, pois sei que ainda ouve minha mente te chamando.
Eu nunca, em toda minha vida, imaginei poder viver isso. Ah, eu juro, é verdade! Eu realmente provei minha insanidade, coragem e fidelidade para comigo mesma. Não sei se alcancei compreensão, mas eu conheço minhas verdades.
Você me surpreende (e não sei por que ainda o faz), toda vez em que fala comigo com tamanha frieza. Parecemos dois desconhecidos, ou pessoas distantes, mas ao mesmo tempo, existe conexão. Porque em minha cabeça se passa um filme onde somos protagonistas e nos amamos com tanto vigor que causamos inveja em qualquer outro casal, onde ouço você me dizendo do seu amor tão grande, dizendo ainda que sei fazer em você um efeito jamais feito por outra. Por que sinto isso? Será que sou só eu?
Talvez eu não viva alguma história assim novamente, talvez eu admire minha força sozinha vendo a chuva cair na rua ou em meus olhos. Talvez eu sempre nos veja. Mas nós tentamos! E nosso erro foi a única causa de me fazer recuar. Simplesmente porque resolvi escolher a coisa certa, que você concordou. E embora minha curiosidade sobre saber como tem sido para você bata forte, preciso superar, pois perdi o direito de saber qualquer coisa relacionada a você.
Queria saber como é pra vocês dois, se ela é melhor que eu. Sei que não nos substituiremos, pois pessoas não são substituíveis. E talvez fosse bom ter alguém pra viver outra história, espero ter e espero que você também tenha. Mas que você nunca esqueça, quis muito viver nós dois. E você sabe que não éramos pra ser...
Eu sinto saudade todo dia.
Talvez você não tenha merecido mesmo, talvez tenha me traído, seu orgulho é o maior que já vi, mas quando éramos singular, eu via sinceridade.
Nunca fui dependente de você, você e eu nos fazíamos tão bem...
Eu sei que não posso exigir nada, que não devo e que é errado, mas será que você vai me surpreender? Você sabe, datas se aproximam... Você vai lembrar e me surpreender?
Enfim, minhas mãos estão atadas para nós. 

Um mês sem você.

Aos vinte e três anos que você não pôde completar.

Bom, já faz algum tempo que não te vejo, acho que são dois anos, estou certa? E lembro sempre de você, eu deveria ter esquecido? Tivemos muitos momentos juntas, mas nunca soube reconhecer o tamanho do meu amor por você e demonstrar isso, enquanto pude. E hoje eu sinto saudade de você. Acho que sou meio confusa demais, meio errada demais, meio complicada demais. Eu realmente me arrependo, eu aprendi muito depois de sua partida. Não queria ter aprendido dessa forma.
Eu não sei se você entende. Eu não sei o que é. Sei que depois que você foi, fiquei te encontrando nos caminhos que você fazia, fiquei te encontrando perto de sua casa, fiquei te encontrando em todo lugar. Ainda vejo rostos parecidos com o seu, mas sei que não é você. Assim como bastava eu voltar à realidade pra saber que não era você em nossos encontros por aí.
E ao que interessa: o motivo de te escrever. Eu precisava homenagear você, aos vinte e três anos que você não pôde completar. Faço o que deveria ter feito antes, e que nunca vou me perdoar por não ter feito. Queria voltar aos anos atrás, por mais clichê que isso seja, eu queria mesmo ter ido aí, queria ter te abraçado e dado parabéns, queria ter falado que te amo pra você ficar sabendo que essa pessoa estranha que eu sou te amava.
E eu sei que hoje é só saudade. Não sou eu apenas que sinto. Eu achei que teríamos tempo ainda, tempo de viver o tempo tão grande que habitaria na nossa juventude, assim como habitou na nossa infância. Não tivemos esse tempo, eu não tive tempo e perdi o tempo pouco que tive.
Já faz um tempo e nem em sonhos eu te encontro mais. Nem em sonhos eu posso matar a saudade. Eu realmente me sinto chateada em saber que falhei. Eu sempre falho... Mas eu quero que apesar disso você nunca esqueça que eu realmente amo você. Eu lembro de muitas coisas ainda. De brigas infantis, de brincadeiras, de nossas conversas por mais raras que elas fossem, de tudo. Você é inesquecível. Sempre vai ser. Queria ter passado mais tempo contigo. Eu sei que não adianta isso agora, mas eu preciso falar. Mesmo que você não saiba. Espero que em vida você nunca tenha duvidado do meu amor por você. E espero que em algum lugar você esteja em vida me esperando pra dar o abraço que tanto esperei e não pude dar...

Enfim, daqui a alguns minutos será oficialmente o seu aniversário, e eu repito mais uma vez: Eu sempre amarei você!

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Eu não preciso de ácido, não preciso de fogo a me queimar, não preciso estar numa caixa cheia de cubos de gelo, não preciso. Não preciso de palavras ásperas. Só preciso envolver-me em seda, e senão for seda, que eu me envolva então em meus edredons. Que eu fique lá por horas, descansando, pensando e esquecendo. Que eu fique lá, em segurança. Que as lágrimas sejam poupadas, que haja paz. Que eu sinta que ali ninguém poderia me ferir. Que eu encontre conforto pra tudo aquilo que há tempos tanto incomoda.

Frutos de uma péssima memória.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Ontem eu acordei assim: meio triste, meio sem jeito, meio sem esperança, meio de coração quebrado. Ignorei o café, deixei de lado a tevê, passei reto por todas as coisas que costumava fazer pela manhã e fui para o jardim. Eu precisava mesmo ficar exposta ao sol, eu precisava senti-lo aquecer minha alma, eu precisava de luz.
Deitei-me então, como uma criança que deita na grama. Alguns minutos se passaram junto com lembranças vagas dos acontecimentos rotineiros, quando de repente uma surpresa: Uma borboleta pousou sobre a minha mão. Você consegue imaginar o quanto isso é raro pra mim? Eu esqueci todo o resto.
Esqueci o peso dos anos passados que se apoiavam em meus ombros, esqueci aquele medo de errar que era a real causa dos meus erros, esqueci a constante tempestade interna que eu vivenciava. Eu esqueci. Pela primeira vez na vida uma borboleta estava ali a me encantar, descansando em minha mão como se houvesse vindo para me fazer companhia.
Como era linda!
Como era frágil!
Como conseguia me trazer força!
Eu precisava cuidar dela tanto quanto ela aparentava cuidar de mim naquele instante. Eu havia, por um breve período, conseguido esquecer meus medos.
O único problema foi esquecer demais.
Esqueci que borboletas também voam. Esqueci que eu não podia lhe privar de sua liberdade. Esqueci que em algum momento ela voaria pra longe e eu não seria capaz de prendê-la.
Ela se foi.
Desde então o jardim nunca mais foi o mesmo. Toda manhã que acordo daquele jeito, corro pra lá, deito na grama, tomo um sol... E ela continua a voar por aí.

Gotas no vidro.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Éramos eu, um ônibus cheio de estranhos e vários sonhos escorrendo como as gotas de chuva que escorriam pelo vidro. Chovia lá fora, as pessoas passavam depressa, como se toda a vida se resumisse a chegar mais cedo no trabalho, ou não perder o dia de faculdade. Mas e ali, dentro daqueles corações? O que será que existia? Talvez houvessem planos frustrados e amores deixados de lado. Talvez a rotina fosse só fruto de corações covardes que se recusaram a lutar pela única coisa que daria às suas vidas algum sentido real.
Meu corpo estava dentro daquele ônibus, mas meu coração há tempos já permanecia lá fora, longe...
A vida não é justa e ela não será justa até que o amor deixe de ser algo que só dá certo em filmes, então eu continuo pensando no nosso clichê tão bonito. Às vezes me pego vendo vestidos de noiva nas vitrines das lojas e acabo por achando graça daquele cisco de esperança que me alimenta dia após dia. As vezes eu olho as crianças correndo no parque, eu vejo os pais carregando os filhos nos ombros, eu vejo casais apaixonados sorrindo, mas eu sou só mais uma estranha no ônibus. Só mais uma estranha que chora silenciosamente sem nenhum motivo conhecido. Sem nenhuma razão que seja válida para os outros. Eu sou só mais uma sombra que observa a água na janela e que se atrevera a sonhar. Só mais alguém que se alimenta de um passado tão cheio de brilho e um futuro quase invisível. Só mais uma.

Até logo.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Morte e vida estão completamente conectadas. Há aqueles que já partiram... talvez tenham encontrado vida. E há aqueles que sobrevivem, mas estão mortos. Nunca consegui entender essa loucura aí que chamam de "vida". V-I-D-A... Quatro letras, mas de uma complexidade incontável. Eu costumava mergulhar contra correntezas de rios gélidos, por vezes me feriram a pele. A dor é fria e quanto mais ela dura, mais ela te entorpece. À todo o instante estive em uma prisão diferente. Cárcere maldito! Mas é assim mesmo: Ninguém sai da "vida" completamente inteiro. Sempre tem algo quebrado, impossível de consertar. Talvez você não entenda, talvez ninguém entenda, é incompreensível até pra mim! Não te condeno por não saber compreender. Não me condenes por querer descobrir outra forma de vida, porque talvez em algum lugar além desse céu azul, exista vida. O céu é longe, intocável. Alto demais para que a dor possa chegar até lá. Eu sei que percorrendo as estradas do paraíso, estarei em segurança. Hoje resolvi dar lugar para as minhas asas aparecerem. Hoje deixo a prisão, pronta para embalar na brisa fresca e serenamente, voar. Se perguntarem por mim, apenas diga que estou voando por aí, diga que fiz das nuvens meu lugar de descanso. Diga que estarei sonhando pra sempre... Saiba que estou deixando toda a minha história nas mãos daqueles que por toda essa jornada, deram-me o presente mais nobre: amor. Se possível, transformem-a em seus sorrisos. Perdoe-me por não ter encontrado a melhor forma de cuidar, a melhor forma de estar ao lado, a melhor forma de ser, mas eu juro que por todo o tempo, tentei ser o melhor que pude. Prometo que nunca mais te farei sofrer por ver o meu choro, não te farei mais chorar pelos meus erros. Prometo. Não poderei te acalmar, não poderei te abraçar, não poderei te ouvir. Mas quando você sentir a chuva tocar seu rosto, quando o sol aquecer-lhe corpo, lembre-se de que um dia eu estive aí, bem ao seu lado. Guarde todas as lembranças, não deixe que as roubem de ti. Um dia voaremos juntos, não se esqueça. Mas por hora, cuide do que confiei em suas mãos.

Mãe;

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Sinto falta de poder correr pro teu colo. Não há mais ninguém aqui além de mim. Não há para onde correr, não há lugar para onde eu possa fugir. É a velha história dos pensamentos repetitivos de pessoas dizendo: "Encare os problemas de frente." Que problemas? É só confusão e cansaço mental. Talvez realmente exista algum problema, mas não consigo encontrar agora. O som da chuva lá fora me faz querer ver as gotas na janela. Está confortável aqui, cobertores são sempre o melhor abrigo quando se quer ir embora. É bom sentir-se abrigado no frio, deve ser essa a sensação que eu tinha enquanto dormia no teu útero. É legal andar na rua e ver as pessoas andando quando faz muito frio, enquanto elas conversam, sai fumaça da boca delas. Você lembra, mãe? Eu sempre ria disso. Quando eu era pequena gostava de fazer isso, era a minha forma de ver se estava realmente frio. Eu abria a boca, se saísse fumaça estava frio. Eu ficava correndo pela casa usando meias e até esquecia que existiam sapatos. Eu odiava tênis, sandálias ou sapatos, gostava de me sentir livre, sempre gostei. Aí ficava andando de meias... Até você gritar: "TIRA ESSES PÉS DO CHÃO GELADO!" Se fosse agora eu usaria aquela frase básica que te deixaria irritada: "Mas se eu tirar os pés do chão, vou cair!" Ahh mãe! Herdei a sua ironia. Era só correr pro sofá, melhor ficar presa no sofá por horas assistindo o desenho do elefantinho do que ter que usar tênis. Argh! Sensação maldita de que meus pés estavam amarrados. Será que toda criança dos anos 90 usou allstar? É tão típico, todo mundo tinha um. Na escolinha, as mães amarravam o cadarço em volta do tornozelo das crianças, era engraçado. Eu não entendia o motivo disso, acho que era pro tênis não sair do pé, já que criança gosta de fazer estrepolias. Eu sempre gostei - sempre precisei -  ser livre, por isso eu ficava observando os passarinhos no jardim quando tinha quatro anos. Mãe, você se lembra quando eu olhava pra gaiola do passarinho que tinha em casa e ficava triste? É porque era ruim imaginar os outros pássaros voando livres pelo céu, as vezes vários juntos, e o pobre do passarinho da gaiola estava ali, sozinho, preso. Eu tinha só quatro anos, todo o meu mundo era limitado à uma casa, um quintal, uma árvore com balanço e um pequeno jardim. E agora, olha pra mim! As coisas começaram a mudar. O meu rosto no espelho não é mais o mesmo, minha maior alegria não é mais ir até o parque e conversar com outras crianças, porque hoje as crianças cresceram e elas aprenderam a ser indiferentes. Eu aprendi a sentir... na verdade, eu desaprendi. Hoje eu tenho motivos maiores pra chorar do que quando você me dava bronca por espalhar brinquedos pela casa ou por brincar com as suas roupas. Hoje você já não pode me pegar no colo quando eu sinto aquela dor presa na garganta... porque as vezes eu mal consigo falar sobre os motivos. Por que a gente fica tão bobo quando cresce, mãe? Eu sempre te ouvi dizer: "As pessoas crescem e ficam bobas." Você tinha razão. E eu só percebo que o tempo passou quando eu vejo o frio me trazer lembranças, e essas lembranças me trazerem lágrimas. A gente cria asas com o tempo, tenta voar, e um dia as asas quebram. A graça se perde também.
Mãe, quando eu te olhar e você ver tristeza em mim, não me pergunte o motivo, porque eu não vou te preocupar com as minhas dores. Apenas me abrace. Me faça sentir segura de novo. Apenas diga que está tudo bem. No fim, vai ficar tudo bem mesmo.